terça-feira, 25 de outubro de 2011

"Se eu pudesse" - Poema de Alberto Caeiro


Martin Johnson Heade (1819-1904), Sunset Over the Marshes, 1890-1904


Se eu pudesse


Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento…
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural…

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva…

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica…
Assim é e assim seja …


Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XXI" 
Heterónimo de Fernando Pessoa


Martin Johnson Heade, The Roman Newsboys, 1848 


"As crianças são os únicos seres divinos que a nossa pobre humanidade conhece. Os outros anjos, os das asas, nunca aparecem. Os santos, depois de santos ficam na Bem-aventurança a preguiçar, ninguém mais os enxerga. E, para concebermos uma ideia das coisas do Céu, só temos realmente as criancinhas..." 

Eça de Queirós, A Ilustre Casa de Ramires

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