sábado, 11 de fevereiro de 2012

"Desejo" - Poema de Casimiro de Abreu


Pintura de An He (Guangzhou, China, 1957)



Desejo


Se eu soubesse que no mundo
Existia um coração,
Que só por mim palpitasse
De amor em terna expansão;
Do peito calara as mágoas,
Bem feliz eu era então! 

Se essa mulher fosse linda 
Como os anjos lindos são, 
Se tivesse quinze anos,
Se fosse rosa em botão, 
Se inda brincasse inocente
Descuidosa no gazão; 

Se tivesse a tez morena, 
Os olhos com expressão, 
Negros, negros, que matassem, 
Que morressem de paixão, 
Impondo sempre tiranos
Um jugo de sedução; 

Se as tranças fossem escuras, 
Lá castanhas é que não,
E que caíssem formosas
Ao sopro da viração, 
Sobre uns ombros torneados,
Em amável confusão; 

Se a fronte pura e serena 
Brilhasse d'inspiração, 
Se o tronco fosse flexível
Como a rama do chorão, 
Se tivesse os lábios rubros,
Pé pequeno e linda mão; 

Se a voz fosse harmoniosa 
Como d'harpa a vibração,
Suave como a da rola 
Que geme na solidão,
Apaixonada e sentida
Como do bardo a canção; 

E se o peito lhe ondulasse 
Em suave ondulação, 
Ocultando em brancas vestes 
Na mais branda comoção 
Tesouros de seios virgens,
Dois pomos de tentação; 

E se essa mulher formosa 
Que me aparece em visão, 
Possuísse uma alma ardente, 
Fosse de amor um vulcão; 
Por ela tudo daria...
— A vida, o céu, a razão! 




Casimiro de Abreu


Casimiro José Marques de Abreu (1839-1860), poeta romântico brasileiro. Dono de rimas cantantes, ao gosto do público, Casimiro de Abreu publicou apenas um livro, As Primaveras (1859). Filho de um rico comerciante, Casimiro de Abreu nasceu em Barra de São João (Rio de Janeiro) e cresceu no Rio, então capital do Império e centro cultural do país. Entre 1853 e 1857, estudou em Portugal. A vocação literária, porém, suplantou a vida académica. Em Lisboa, iniciou-se como poeta e dramaturgo. A peça Camões e Jaú estreou no teatro D. Fernando e, nela, o autor proclama sua brasilidade, as saudades dos trópicos e refere-se a Portugal como "velho e caduco". De volta ao Brasil, dedicou-se à atividade comercial, com o apoio paterno. Mas definia este trabalho como uma "vida prosaica…que enfraquece e mata a inteligência". Morreu aos 21 anos, de tuberculose, em Nova Friburgo, estado do Rio de Janeiro. Seu poema mais famoso é Meus Oito Anos. Da segunda geração romântica brasileira, Casimiro de Abreu cultivava um lirismo de expressão simples e ingénua. Seus temas dominantes foram o amor e a saudade. Embora criticado por deslizes de linguagem e falta de embasamento filosófico, Casimiro de Abreu é admirado, justamente, pela simplicidade. Alguns versos acabaram se incorporando à linguagem corrente como, por exemplo, simpatia é quase amor, hoje nome de um famoso bloco do carnaval carioca. 
É pequena a obra poética de Casimiro de Abreu. Porém, deixou-nos de forma marcante, a poesia da saudade: "Canção do exílio" ("Meu lar") em que partia da aceitação premonitória, "Se eu tenho de morrer na flor dos anos", para a formulação de um desejo que se realizou plenamente: "Quero morrer cercado dos perfumes / Dum clima tropical.”“Meus Oito Anos, Minha Terra” - poemas escritos em Portugal, onde adquiriu sua educação literária. (Daqui)


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