sábado, 27 de abril de 2013

"Posso escrever os versos mais tristes" - Poema de Pablo Neruda


Eugene de Blaas (Italian painter, 1843-1931), The Watercarrier, 1908



Posso escrever os versos mais tristes


Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os astros lá ao longe".
O vento da noite gira no céu e canta.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu amei-a e por vezes ela também me amou.
Em noites como esta tive-a em meus braços.
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.

Ela amou-me, por vezes eu também a amava.
Como não ter amado os seus grandes olhos fixos.
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não a tenho. Sentir que já a perdi.

Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.
Importa lá que o meu amor não pudesse guardá-la.
A noite está estrelada e ela não está comigo.

Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe.
A minha alma não se contenta com havê-la perdido.
Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a.
O meu coração procura-a, ela não está comigo.

A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores.
Nós dois, os de então, já não somos os mesmos.
Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei.
Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido.

De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos.
Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda.
É tão curto o amor, tão longo o esquecimento.

Porque em noites como esta tive-a em meus braços,
a minha alma não se contenta por havê-la perdido.
Embora seja a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.


Pablo Neruda


Eugene de Blaas, The Serenade, 1910, Oil on canvas.


Eugene de Blaas, The Flirtation, 1904


Eugene de Blaas, The Love Letter, 1904


Eugene de Blaas, Flirtation at the Well, 1902


O artista Eugene de Blaas também conhecido como Eugenio De Blaas ou Eugen von Blaas, nasceu em 24 de julho na cidade italiana de Albano, perto de Roma, em 1843, de pais austríacos. Sua carreira foi enriquecida por uma família talentosa e artística. Seu pai, Carl von Blaas (1815-1894), professor na Academia de Roma e na Academia de Veneza, foi um dos retratistas mais notáveis ​​da sociedade romana. Seu irmão mais novo, Júlio, também foi um pintor, dedicado principalmente aos animais e questões militares.
 Em todas as academias que frequentou, Eugene de Blaas cultivou preciosos prémios, mas foi em Veneza que  se destacou e se estabeleceu como um pintor de óleo, líder do género Venetian e também em aquarelas. Seu tema favorito foi o quotidiano do povo veneziano. Pintava com técnica apurada e cores vibrantes que demonstram seu total domínio na arte do retrato. Ele descreveu cenas que eram características de Veneza, como os pescadores locais, belas mulheres cercadas por gondoleiros e a arquitetura maravilhosa. Retratou o charme e a elegância de Veneza, apostando na pele, cabelos, rendas, bordados e outras texturas macias.
Visitou a Bélgica, Viena, França e viveu na Inglaterra por um tempo. Entre 1875 e 1892, também se exibiu na “Royal Academy”, na Galeria de Grafton e na Galeria Nova em Londres. Apresentou-se em muitas coleções particulares e nos museus de Leicester, Melbourne, Nottingham, Sheffield Sydney e Viena. Eugene de Blaas morreu no dia 10 fevereiro, na cidade italiana de Veneza, em 1932.


Eugene de Blaas, Sur le Balcon, 1877

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