domingo, 10 de agosto de 2014

"Quando eu sonhava" - Poema de Almeida Garrett


Columbano Bordalo Pinheiro, Retrato de Alda Lino, 1910
 


Quando eu sonhava


Quando eu sonhava, era assim 
Que nos meus sonhos a via; 
E era assim que me fugia, 
Apenas eu despertava, 
Essa imagem fugidia 
Que nunca pude alcançar. 
Agora, que estou desperto, 
Agora a vejo fixar... 
Para quê? - Quando era vaga, 
Uma ideia, um pensamento, 
Um raio de estrela incerto 
No imenso firmamento, 
Uma quimera, um vão sonho, 
Eu sonhava - mas vivia: 
Prazer não sabia o que era, 
Mas dor, não na conhecia... 


Almeida Garrett,
 in 'Folhas Caídas'


Columbano Bordalo Pinheiro, A Chávena de Chá, 1898





Almeida Garrett
(Vida e Obra)

Painel de Columbano Bordalo Pinheiro, na Sala dos Passos Perdidos, Assembleia da República Portuguesa,


Iniciador do Romantismo, refundador do teatro português, criador do lirismo moderno, criador da prosa moderna, jornalista, político, legislador, Almeida Garrett é um exemplo de aliança inseparável entre o homem político e o escritor, o cidadão e o poeta. É considerado, por muitos autores, como o escritor português mais completo de todo o século XIX, porquanto nos deixou obras-primas na poesia, no teatro e na prosa, inovando a escrita e a composição em cada um destes géneros literários.

João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett nasceu em 1799 no Porto, no seio de uma família burguesa, que se refugia em 1809 na Ilha Terceira, a fim de escapar à Segunda invasão francesa de Portugal. Nos Açores, recebe uma educação clássica e iluminista (Voltaire e Rousseau, que lhe ensinam o valor da Liberdade), orientada pelo tio, Frei Alexandre da Conceição, Bispo de Angra, ele próprio escritor.

Em 1817, vai estudar Leis para Coimbra, foco de fermentação das ideias liberais. Em 1820, finalista em Coimbra, recebe com entusiasmo e otimismo a notícia da Revolução liberal. Em 1821, representa o Catão e publica em Coimbra O Retrato de Vénus, obras marcadas ainda por um estilo arcádico. Arcádicos são igualmente os poemas que escreve durante este período e que serão insertos, em 1829, na Lírica de João Mínimo.
Em 1822, é nomeado funcionário do Ministério do Reino, casa com Luísa Midosi e funda o jornal para senhoras O Toucador.

Em 1823, com a reação miguelista da Vilafrancada é obrigado a exilar-se em Inglaterra, onde inicia o estudo do Romantismo (inglês), e depois em França, onde se torna correspondente de uma filial da casa Lafitte. Contacta então com a literatura romântica (Byron, Lamartine, Vítor Hugo, Schlegel, Walter Scott, Mme de Staël), redescobre Shakespeare e, influenciado pelas recolhas de cancioneiros populares, começa a preparar o Romanceiro.

Em 1825 e 1826, publica em Paris os poemas Camões e Dona Branca, primeiras obras portuguesas de cunho romântico, fruto da metamorfose estética em si operada pelas novas leituras. Em 1826, publica também o Bosquejo da História da Poesia e Língua Portuguesa, como introdução à antologia de poesia portuguesa Parnaso Lusitano.

Em 1826, durante um período de tréguas, regressa a Portugal e mostra-se confiante na Carta Constitucional  acordada entre D. Pedro D. Miguel, mais moderada que o programa Vintista. Dedica-se ao jornalismo político nos jornais O Português e O Cronista.

Em 1828, depois da retoma do poder absoluto por parte de D. Miguel, exila-se novamente em Inglaterra. Em 1829, publica em Londres a Lírica de João Mínimo e o tratado Da Educação. Em 1830, publica o tratado político Portugal na Balança da Europa, onde analisa a história da crise portuguesa e exorta à unidade e à moderação.  

Em 1832, parte para a Ilha Terceira, incorpora-se no exército liberal, e participa no Desembarque em Mindelo. Escreve, durante o Cerco do Porto, o romance histórico O Arco de Santana e colabora com Mouzinho da Silveira nas reformas administrativas.

Em 1834, é nomeado cônsul-geral em Bruxelas, numa espécie de terceiro exílio motivado pelo cada vez maior desencanto em relação à política portuguesa (a divisão dos liberais, a corrida aos cargos públicos), onde contacta com a língua e a literatura alemãs (Herder, Schiller e Goethe). Também exerceu funções diplomáticas em Londres e em Paris.

Em 1836, regressa a Lisboa, separa-se de Luísa Midosi e funda o jornal O Português Constitucional. No mesmo ano, após a Revolução de setembro, é incumbido pelo governo setembrista de Passos Manuel da organização do Teatro Nacional. Nesse âmbito, desenvolverá uma ação notável, dirigindo a Inspeção Geral dos Teatros e o Conservatório de Arte Dramática, intervindo no projeto do futuro Teatro Nacional de D. Maria II e escrevendo ao longo dos anos seguintes todo um repertório dramático nacional: Um Auto de Gil Vicente (1838), Dona Filipa de Vilhena (1840), O Alfageme de Santarém (1842), Frei Luís de Sousa (1843). É por esta altura que inicia um romance com Adelaide Deville, que morrerá em 1841, deixando-lhe uma filha (episódio que inspirará o Frei Luís de Sousa).

 Em 1838, torna-se deputado da Assembleia Constituinte e membro da comissão de reforma do Código Administrativo.
No ano de 1843 publica o 1.º volume do Romanceiro, uma recolha de poesias de tradição popular.
Em 1845, lança o livro de poesias líricas Flores sem Fruto e o 1.º volume do romance histórico O Arco de Sant'Ana. 
Em 1846, sai em volume o "inclassificável" livro das Viagens na Minha Terra, publicado um ano antes em folhetim na Revista Universal Lisbonense. Com este livro, a crítica considera iniciada a prosa moderna em Portugal.

Em 1851, depois de um período de distanciamento face à vida política, regressa com a Regeneração, movimento que prometia conciliação e progresso. Nesse ano, funda o jornal A Regeneração, aceita o título de visconde e reassume o seu papel de deputado, colaborando na proposta de revisão da Carta. Em 1852, torna-se, por pouco tempo, ministro dos Negócios Estrangeiros.

Em 1853, publica o livro de poesias líricas Folhas Caídas, recebido com algum escândalo: o poeta era, na época, uma figura pública respeitável (deputado, ministro, visconde), que se atrevia a cantar o amor desafiando todas as convenções, e muitos souberam ver na obra ecos da paixão do autor pela viscondessa da Luz, Rosa de Montufar.

Em 1854, morre em Lisboa, aos cinquenta e cinco anos.

Em 1999 comemorou-se o Bicentenário do nascimento de Almeida Garrett, com a realização de conferências, publicações das suas obras, espetáculos, atividades escolares, exposições, entre outros eventos.

Almeida Garrett. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [Consult. 2014-08-10].


 

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