quinta-feira, 13 de novembro de 2014

"Havemos de ser outros amanhã" - Poema de Alice Vieira


Torre de Belém em Lisboa, iniciada em 1514 no reinado de Manuel I de Portugal (1495-1521), 
tendo como arquitecto Francisco de Arruda.


Havemos de ser outros amanhã


havemos de ser outros amanhã
ou daqui a momentos ou já agora
e dificilmente reconheceremos o espaço da alegria
em que noutras horas chegámos a nascer

e então meu amor
(não sei se reparaste mas é a primeira vez
que escrevo meu amor)
teremos nos olhos a cor sem cor
das roupas muito usadas
e guardaremos os despojos das noites
em que tudo sem querer nos magoava
nas gavetas daqueles velhos armários
com cheiro a cânfora e a tempo inútil
onde há muitos anos escondemos
um postal da Torre de Belém em tons de azul
e um bilhete para a matiné das seis no São Jorge
onde um homem (que muitos anos depois
segundo me contaram se suicidou)
tocava orgão nos intervalos em que
nos beijávamos às escondidas

e dessas gavetas rebenta a poeira do tempo
que matámos a frio dentro de nós
com os filhos que perdemos em camas de ninguém
e as pedras que nasceram no lugar das cinzas
e havemos de perguntar (mesmo sabendo que
já não há ninguém para nos responder)
por que foi que nos largaram no mundo
vestidos de tão frágeis certezas
por que nos abandonaram assim
no rebentar de todas as tempestades
sabendo que o futuro que nos prometiam batia
ao ritmo das horas que já tinham sido
destinadas a outros e nunca
voltariam a tempo de nos salvar

mas enquanto vai escorrendo de nós o pó
desses lugares onde ainda há vozes
que não desistiram de perguntar por nós
vamos bebendo a água inicial das nossas línguas
um ao outro devolvendo o pouco 
que conseguimos salvar de todos os dilúvios 


Alice Vieira


Alice Vieira

Alice Vieira (Lisboa, 20 de março de 1943) é uma escritora e jornalista profissional portuguesa.
 
 
Dedicou-se desde cedo ao jornalismo, tendo trabalhado nos jornais Diário de Lisboa (onde, juntamente com o seu marido, o jornalista e escritor Mário Castrim, dirigiu o suplemento "Juvenil"), Diário Popular e Diário de Notícias e colaborou durante muitos anos com a revista "Activa" e o "Jornal de Notícias". Atualmente colabora na revista Audácia, dos Missionários Combonianos.
 
Trabalhou em vários programas de televisão para crianças e é considerada uma das mais importantes autoras portuguesas de literatura infanto-juvenil.
 
As suas obras foram traduzidas para várias línguas, como o alemão, o búlgaro, o basco, o castelhano, o galego, o catalão, o francês, o húngaro, o holandês, o russo, o italiano, o chinês, o servo-croata. (Daqui)


Torre de Belém (Arquitetura manuelina) vista do Rio Tejo.


A Torre de Belém, um dos pontos turísticos mais famosos e visitados de Portugal. Sua construção foi iniciada em 1515 e terminou em 1519.
Classificada como Património Mundial pela UNESCO desde 1983, foi eleita como uma das Sete maravilhas de Portugal em 7 de julho de 2007.


Arquitetura manuelina


Estilo manuelino, por vezes também chamado de gótico português tardio ou flamejante, é um estilo decorativo, escultórico e de arte móvel que se desenvolveu no reinado de D. Manuel I e prosseguiu após a sua morte, ainda que já existisse desde o reinado de D. João II. É uma variação portuguesa do Gótico final, bem como da arte luso-mourisca ou arte mudéjar, marcada por uma sistematização de motivos iconográficos próprios, de grande porte, simbolizando o poder régio. Incorporou, mais tarde, ornamentações do Renascimento italiano. O termo "Manuelino" foi criado por Francisco Adolfo Varnhagen na sua Notícia Histórica e Descritiva do Mosteiro de Belém, de 1842. O Estilo desenvolveu-se numa época propícia da economia portuguesa e deixou marcas em todo o território nacional.

A característica dominante do Manuelino é a exuberância de formas e uma forte interpretação naturalista-simbólica de temas originais, eruditos ou tradicionais. A janela, tanto em edifícios religiosos como seculares, é um dos elementos arquitetónicos onde melhor se pode observar. Estes motivos aparecem em construções, pelourinhos, túmulos ou mesmo peças artísticas, como em ourivesaria, de que a Custódia de Belém é um exemplo.

Os motivos mais frequentes da arquitetura manuelina são a esfera armilar, conferida como divisa por D. João II ao seu primo e cunhado, futuro rei D. Manuel I, mais tarde, interpretada como sinal de um desígnio divino para o reinado de D. Manuel, a Cruz da Ordem de Cristo e elementos naturalistas: Corais, Algas, Alcachofras, Pinhas, animais vários e elementos fantásticos: Ouroboros, Sereias, gárgulas.

No seu conjunto, a arquitetura manuelina  pouco muda relativamente à estrutura formal do gótico alemão e plateresco. O alçado interior das igrejas mantém-se através da orientação este-oeste, da planta, dos sistemas de suporte e cobertura, do cálculo de proporções. As naves da mesma altura, influência das igrejas-salão alemãs, de cinco tramos, ausência de transepto e cabeceiras retangulares são as principais características diferenciais. Apesar de ser essencialmente ornamental, o Manuelino caracteriza-se também pela aplicação de determinadas fórmulas técnicas da altura, como as abóbadas com nervuras polinervadas a partir de mísulas.

Na componente civil destacam-se os palácios, como o Paço de D. Manuel, em Évora, e solares rurais, como o Solar de Sempre Noiva, em Arraiolos, todos de planta retangular.
Na tipologia militar é referência maior o baluarte do Restelo, a Torre de Belém. Um dos primeiros baluartes de artilharia do país, a quebrar a tradição das torres de menagem, a sua planta retangular sobrepõe-se a uma base poliédrica, que penetram Tejo adentro. A retangularidade da planta opõe-se à curvilínea da decoração esculpida. (Daqui)
 
 

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