terça-feira, 18 de outubro de 2016

"Confissão" - Poema de Carlos Drummond de Andrade


Valentín Thibon de Libian (1889-1931), En el café (El café de las midinettes), c.1919


Confissão


É certo que me repito, 
é certo que me refuto 
e que, decidido, hesito 
no entra-e-sai de um minuto. 

É certo que irresoluto 
entre o velho e o novo rito 
atiro à cesta o absoluto 
como inútil papelito. 

É tão certo que me aperto 
numa tenaz de mosquito 
como é trinta vezes certo 
que me oculto no meu grito. 

Certo, certo, certo, certo 
que mais sinto que reflito 
as fábulas do deserto 
do raciocínio infinito. 

É tudo certo e prescrito 
em nebuloso estatuto. 
O homem, chamar-lhe mito 
não passa de anacoluto. 


in 'As Impurezas do Branco'


Valentín Thibon de Libian, El ocaso, 1930


"Eu acredito que a poesia tenha sido uma vocação, embora não tenha sido uma vocação desenvolvida conscientemente ou intencionalmente. Minha motivação foi esta: tentar resolver, através de versos, problemas existenciais internos. São problemas de angústia, incompreensão e inadaptação ao mundo." - Carlos Drummond de Andrade
 
 

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