sexta-feira, 11 de setembro de 2020

"O Velho" - Poema de Rui Knopfli


Bruno Liljefors (Swedish wildlife painter, 1860 –1939), 1906, by Anders Zorn



O Velho


Não envelheço. Torno-me antigo.
O velho sempre viveu em mim,
sempre o pressenti no olhar
magoado demorando-se nas coisas,
em certa lentidão não premeditada
dos gestos e nas lembranças confusas
de uma outra recuada idade.
Sempre aflorou na mão e na estima
triste que se estende aos amigos,
na aresta de desconsolo que espreita
as minhas horas de amor.
O velho sempre viveu em mim.
Eis que, enfim, o reboco
se lhe começa a assemelhar.


Rui Knopfli, in Memória Consentida: 
20 Anos de Poesia 1959-1979, 1982
 

Anders Zorn (Swedish painter, sculptor, and etching artist, 1860–1920),
 Self-portrait in red, 1915.


Sem nada de meu


Dei-me inteiro. Os outros
fazem o mundo (ou crêem
que fazem). Eu sento-me
na cancela, sem nada
de meu e tenho um sorriso
triste e uma gota
de ternura branda no olhar.
Dei-me inteiro. Sobram-me
coração, vísceras e um corpo.
Com isso vou vivendo.

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