Havemos de ser outros amanhã
havemos de ser outros amanhã
ou daqui a momentos ou já agora
e dificilmente reconheceremos o espaço da alegria
em que noutras horas chegámos a nascer
e então meu amor
(não sei se reparaste mas é a primeira vez
que escrevo meu amor)
teremos nos olhos a cor sem cor
das roupas muito usadas
e guardaremos os despojos das noites
em que tudo sem querer nos magoava
nas gavetas daqueles velhos armários
com cheiro a cânfora e a tempo inútil
onde há muitos anos escondemos
um postal da Torre de Belém em tons de azul
e um bilhete para a matiné das seis no São Jorge
onde um homem (que muitos anos depois
segundo me contaram se suicidou)
tocava orgão nos intervalos em que
nos beijávamos às escondidas
e dessas gavetas rebenta a poeira do tempo
que matámos a frio dentro de nós
com os filhos que perdemos em camas de ninguém
e as pedras que nasceram no lugar das cinzas
e havemos de perguntar (mesmo sabendo que
já não há ninguém para nos responder)
por que foi que nos largaram no mundo
vestidos de tão frágeis certezas
por que nos abandonaram assim
no rebentar de todas as tempestades
sabendo que o futuro que nos prometiam batia
ao ritmo das horas que já tinham sido
destinadas a outros e nunca
voltariam a tempo de nos salvar
mas enquanto vai escorrendo de nós o pó
desses lugares onde ainda há vozes
que não desistiram de perguntar por nós
vamos bebendo a água inicial das nossas línguas
um ao outro devolvendo o pouco
que conseguimos salvar de todos os dilúvios
Alice Vieira
Dedicou-se desde cedo ao jornalismo, tendo trabalhado nos jornais
Diário de Lisboa (onde, juntamente com o seu marido, o jornalista e escritor
Mário Castrim, dirigiu o suplemento "Juvenil"),
Diário Popular e
Diário de Notícias e colaborou durante muitos anos com a revista
"Activa" e o
"Jornal de Notícias". Atualmente colabora na revista
Audácia, dos Missionários Combonianos.
Trabalhou em vários programas de televisão para crianças e é considerada uma das mais importantes autoras portuguesas de
literatura infanto-juvenil.
As suas obras foram traduzidas para várias línguas, como o alemão, o búlgaro, o basco, o castelhano, o galego, o catalão, o francês, o húngaro, o holandês, o russo, o italiano, o chinês, o servo-croata.
(Daqui)
Torre de Belém (
Arquitetura manuelina) vista do
Rio Tejo.
A
Torre de Belém, um dos pontos turísticos mais famosos e visitados de Portugal. Sua construção foi iniciada em 1515 e terminou em 1519.
Arquitetura manuelina
O
Estilo manuelino, por vezes também chamado de gótico português tardio ou flamejante, é um estilo decorativo,
escultórico e de
arte móvel que se desenvolveu no reinado de
D. Manuel I e prosseguiu após a sua morte, ainda que já existisse desde o reinado de
D. João II. É uma variação portuguesa do
Gótico final, bem como da arte luso-mourisca ou
arte mudéjar, marcada por uma sistematização de motivos iconográficos próprios, de grande porte, simbolizando o poder régio. Incorporou, mais tarde, ornamentações do
Renascimento italiano. O termo
"Manuelino" foi criado por
Francisco Adolfo Varnhagen na sua
Notícia Histórica e Descritiva do Mosteiro de Belém, de
1842. O Estilo desenvolveu-se numa época propícia da economia portuguesa e deixou marcas em todo o território nacional.
A característica dominante do Manuelino é a exuberância de formas e uma forte interpretação naturalista-simbólica de temas originais, eruditos ou tradicionais. A janela, tanto em edifícios religiosos como seculares, é um dos elementos arquitetónicos onde melhor se pode observar. Estes motivos aparecem em construções,
pelourinhos, túmulos ou mesmo peças artísticas, como em
ourivesaria, de que a
Custódia de Belém é um exemplo.
Os motivos mais frequentes da arquitetura manuelina são a
esfera armilar, conferida como divisa por D. João II ao seu primo e cunhado, futuro rei D. Manuel I, mais tarde, interpretada como sinal de um desígnio divino para o reinado de D. Manuel, a Cruz da
Ordem de Cristo e elementos naturalistas:
Corais,
Algas,
Alcachofras,
Pinhas, animais vários e elementos fantásticos:
Ouroboros,
Sereias,
gárgulas.
No seu conjunto, a arquitetura manuelina pouco muda relativamente à estrutura formal do
gótico alemão e
plateresco. O alçado interior das igrejas mantém-se através da orientação este-oeste, da
planta, dos sistemas de suporte e cobertura, do cálculo de proporções. As
naves da mesma altura, influência das
igrejas-salão alemãs, de cinco tramos, ausência de
transepto e
cabeceiras retangulares são as principais características diferenciais. Apesar de ser essencialmente ornamental, o Manuelino caracteriza-se também pela aplicação de determinadas fórmulas técnicas da altura, como as abóbadas com nervuras polinervadas a partir de
mísulas.
Na componente civil destacam-se os
palácios, como o Paço de D. Manuel, em
Évora, e
solares rurais, como o Solar de Sempre Noiva, em
Arraiolos, todos de planta retangular.
Na tipologia militar é referência maior o baluarte do
Restelo, a
Torre de Belém. Um dos primeiros
baluartes de
artilharia do país, a quebrar a tradição das torres de menagem, a sua planta retangular sobrepõe-se a uma base poliédrica, que penetram
Tejo adentro. A retangularidade da planta opõe-se à curvilínea da decoração esculpida.
(Daqui)