John Beaufain Irving (1825-1877), The Gossips, 1873
Na arca aberta o justo peca
Na arca aberta o justo peca,
não em canastra fechada;
mas vós da minha coitada
fechada a fazeis caneca:
vindes lá de seca e meca
com tal pressa e furor tal,
que fazeis, para meu mal,
com mau termo e ruim modo,
do meu queijo lama e lodo,
e do meu pão cinza e sal.
Quando as peras me levais,
então para peras levo,
pois vos pago o que não devo,
e vós rindo vos ficais:
se pera flamenga achais
a comeis em português,
e me fazeis d'essa vez,
com estrondo e com arenga,
os narizes à flamenga
muito mal em que me pez.
Não vos escapam por pés
minhas cerejas bicais,
nem as ginjas garrafais,
se as tenho alguma vez:
porque mal, em que me pez,
como cerejas se vão
pelos pés à vossa mão
e da vossa mão à minha,
a cereja é marouvinha
as ginjas galegas são.
Passa hoje por lebre o gato,
por perdiz passa o francelho
por capão o galo velho,
passa a gaivota por pato:
por arraia passa o rato,
mas é coisa que me encanta,
que passando coisa tanta
com mentira e com trapaça
só a passa não me passa
para baixo da garganta.
António Serrão de Crasto,
in 'Os ratos da Inquisição'
[António Serrão de Crasto nasceu em 1610 e faleceu em 1684. Poeta cristão-novo, foi acusado pela Inquisição e preso durante dez anos. Escreveu na prisão a obra 'Os ratos da Inquisição', publicada por Camilo Castelo Branco em 1883.]
John Beaufain Irving (1825-1877), The Latest News, 1873
"Do fanatismo à barbárie não há mais que um passo."
"Do fanatismo à barbárie não há mais que um passo."
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