segunda-feira, 29 de julho de 2024

"O convite à viagem" - Poema de Charles Baudelaire


 ("Luxury, Calm and Pleasure"), 1904. Oil on canvas, 98.5 cm × 118.5 cm,
   Musée d'Orsay, Paris, France.
 
[The painting's title comes from the poem L'Invitation au voyage, from Charles Baudelaire's volume Les Fleurs du mal (The Flowers of Evil).]
 

O convite à viagem

 
Minha doce irmã,
Pensa na manhã
Em que iremos, numa viagem,
Amar a valer,
Amar e morrer
No país que é a tua imagem!
Os sóis orvalhados
Desses céus nublados
Para mim guardam o encanto
Misterioso e cruel
De teu olho infiel
Brilhando através do pranto.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e langor.

Os móveis polidos,
Pelos tempos idos,
Decorariam o ambiente;
As mais raras flores
Misturando odores
A um âmbar fluido e envolvente,
Tetos inauditos,
Cristais infinitos,
Toda uma pompa oriental,
Tudo aí à alma
Falaria em calma
Seu doce idioma natal.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e langor.

Vê sobre os canais
Dormir junto aos cais
Barcos de humor vagabundo;
É para atender
Teu menor prazer
Que eles vêm do fim do mundo.
- Os sanguíneos poentes
Banham as vertentes,
Os canis, toda a cidade,
E em seu ouro os tece;
O mundo adormece
Na tépida luz que o invade.

Lá, tudo é paz e rigor,
Luxo, beleza e langor.


Charles Baudelaire
, in "As flores do mal".
 Edição bilingue. Tradução de Ivan Junqueira
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
 
 
 
 Charles Baudelaire, "As flores do mal".
 Edição bilingue. Tradução de Ivan Junqueira
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
 
 
 L’invitation au voyage

 
Mon enfant, ma soeur,
Songe à la douceur
D'aller là-bas vivre ensemble!
Aimer à loisir,
Aimer et mourir
Au pays qui te ressemble!
Les soleils mouillés
De ces ciels brouillés
Pour mon esprit ont les charmes
Si mystérieux
De tes traîtres yeux,
Brillant à travers leurs larmes.

Là, tout n'est qu'ordre et beauté,
Luxe, calme et volupté.

Des meubles luisants,
Polis par les ans,
Décoreraient notre chambre;
Les plus rares fleurs
Mêlant leurs odeurs
Aux vagues senteurs de l'ambre,
Les riches plafonds,
Les miroirs profonds,
La splendeur orientale,
Tout y parlerait
À l'âme en secret
Sa douce langue natale.

Là, tout n'est qu'ordre et beauté,
Luxe, calme et volupté.

Vois sur ces canaux
Dormir ces vaisseaux
Dont l'humeur est vagabonde;
C'est pour assouvir
Ton moindre désir
Qu'ils viennent du bout du monde.
— Les soleils couchants
Revêtent les champs,
Les canaux, la ville entière,
D'hyacinthe et d'or;
Le monde s'endort
Dans une chaude lumière.

Là, tout n'est qu'ordre et beauté,
Luxe, calme et volupté. 


Charles Baudelaire
, "Les Fleurs du mal"
(1857 - 1861 - 1868) 
 

Charles Baudelaire, "As flores do mal".
Editora: Penguin-Companhia
 

Resumo 
 
 
Edição bilíngue de um dos mais influentes livros de poemas da modernidade. Obra poética completa de Baudelaire em nova tradução. 
Grafado pelo autor originalmente com letra maiúscula, o “Mal” de Baudelaire é um conceito, uma perceção que perpassa a sua obra e expõe o caráter humano. Livro inovador, que nas palavras de Marcel Raymond e Paul Valéry funda uma espécie de “movimento poético contemporâneo”, As flores do mal foi responsável por uma escandalosa transformação da literatura mundial ao misturar estilos elevados e populares, influenciando escritores como André Gide, Marcel Proust, James Joyce, Thomas Mann, entre outros. 
A primeira edição, publicada em 1857, quando Baudelaire tinha 36 anos, logo se torna objeto de um processo judicial que culmina na proibição de seis poemas. A segunda edição, de 1861, suprime os poemas censurados e inclui outros 35. O poeta também tradutor de Edgar Allan Poe e crítico de arte  foi alvo de discórdia também nos círculos literários. Conhecido por encarar a vida com uma paixão enfastiada, Baudelaire transformou o universo a sua volta em uma poesia forte, visceral e por vezes perniciosa. 
Este volume bilíngue reúne toda a poesia de Baudelaire: As flores do mal tal como publicado em 1861 e os poemas acrescidos à edição póstuma de 1868, em uma edição especial que demonstra toda a potência de um autor ainda hoje “maldito”. (daqui)
 
 

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