"A Lebre e a Tartaruga", Ilustração de Milo Winter
A Lebre e a Tartaruga
(Fábula)
«Apostemos», disse à lebre
A tartaruga matreira,
«Que eu chego primeiro ao alvo
Do que tu, que és tão ligeira!»
Lhe disse a lebre mofando,
«Ou tens perdida a cabeça,
Ou comigo estás zombando.»
Respondeu-lhe a tartaruga:
«Nisso me estás a entender
Que receias apostar
Porque não queres perder.»
Queres competir com a lebre?
Isso é doença, estás vária,
Provém do efeito da febre;
Eu, que por uma charneca
Corro dos galgos em frente,
Que os canso, sem que me possa
No lombo ferrar o dente,
Havia temer a quem
Gasta uma hora em dar um passo?»
Retrucou-lhe a tartaruga
Com todo o desembaraço:
«Leva, amiga, de bazófias
Desculpas não valem nada;
Se tem medo não aposte,
Porém, dê-se por cangada.
Ando no mar e na terra;
Sei muito bem o que é mundo,
Propus-me a apostar contigo
Porque sei no que me fundo.»
«Pois vá feito,» diz a lebre;
«E aquele velho sobreiro
Seja a meta, e leve o prémio
A que chegar lá primeiro;
De juiz não precisamos;
Porque eu na meta vou pôr
As apostas que serão
Da primeira que lá for.»
Eis vai cumprir o que ajusta,
E volta num breve prazo;
Não digo o que foi a aposta
Porque isso não vem ao caso.
Dado o sinal da partida,
Estando as duas a par,
A tartaruga começa
Lentamente a caminhar.
A lebre tendo vergonha
De correr diante dela,
Tratando uma tal vitória
De peta ou de bagatela,
Julga, cheia de vaidade,
Que ainda tempo lhe sobeja
Se entrar a correr já quando
Perto do sobreiro a veja.
Deita-se, e dorme o seu pouco;
Ergue-se, e põe-se a observar
De que parte corre o vento,
E depois entra a pastar;
Eis deita uma vista de olhos
Sobre a caminhante sorna,
Inda a vê longe da meta,
E a pastar de novo torna.
Olha; e depois que a vê perto,
Começa a sua carreira;
Mas então apressa os passos
A tartaruga matreira.
À meta chega primeiro,
Apanha o prémio apressada,
Pregando à lebre vencida
Uma grande surriada.
Não basta só haver posses
Para obter o que intentamos;
É preciso pôr-lhe os meios,
Quando não, atrás ficamos.
O contendor não desprezes
Por fraco, se te investir;
Porque um anão acordado
Mata um gigante a dormir.
in Composições Poéticas
"A Lebre e a Tartaruga" é uma das Fábulas de Esopo (Esopo (620—560 a.C.), que foi posteriormente recontada por Jean de La Fontaine (1621 —1695), na qual uma lenta tartaruga vence a corrida de uma lebre. Moral da História: 'Quem corre cansa, mas devagar se vai longe.' (Daqui)
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