sábado, 9 de abril de 2022

"Ao longo de uma praia um triste dia" - Soneto de Domingos dos Reis Quita


 
XXXIII
 

Ao longo de uma praia um triste dia,
Já quando a luz do sol se desmaiava,
O saudoso Alcino caminhava
Com seus cuidados só por companhia.

Os olhos pelas águas estendia,
Porque alívio a seu mal nelas buscava,
E entre os tristes suspiros que exalava,
Em lágrimas banhado assim dizia:

Os suspiros, as lágrimas que choro
Levai, ondas, levai, ligeiro vento,
Para onde me levastes quem adoro.

Oh, se podeis ter dó do meu tormento,
Que me torneis o bem, só vos imploro,
Que pusestes em longo afastamento.


 
 
Obras Completas de Domingos dos Reis Quita, 
o Alcino Micénio da Arcádia Lusitana 
 

Reis Quita, poeta português nascido em 1728, em Lisboa, e falecido em 1770. Cresceu no seio de uma família humilde e teve, por conseguinte, de valer-se, desde muito novo, do ofício de cabeleireiro, que era na época relativamente bem cotado. Brilhante exemplo de autodidatismo, aprendeu latim, espanhol, italiano e francês.

Munido de diversos contactos com personalidades de categoria, o poeta foi eleito sócio da Arcádia Lusitana, onde adotou o nome de Alcino Micénio, e promovido a bibliotecário do conde de S. Lourenço. Os auspícios deste protetor não foram, todavia, duradouros, uma vez que o conde de S. Lourenço acabou por ser preso às ordens de Pombal, tendo ficado Quita privado dos parcos bens que possuía. Após o terramoto de 1755, caiu na extrema miséria. Foi no fim da vida protegido por Dona Teresa Teodora de Aloim, que ele muitas vezes cantou em ternos idílios e éclogas, atribuindo-lhe o pseudónimo de Tirceia: (...) Oh! Pastora mais firme do que os montes! Mais amante, mais terna do que as rolas! Mais perfeita, mais cândida e formosa Que a pura neve, que a vermelha rosa!(...)

O árcade acabou por morrer de tuberculose com 42 anos. Quita dedicou-se à tragédia, deixando-nos quatro exemplares do género (Hermíone, Astarto, Mégara e Castro), mas foi sobretudo no drama pastoril que o seu génio se evidenciou, através de um bucolismo saudoso e inconsolável. Sujeitou-se inteiramente ao convencionalismo arcádico, revelando, no entanto, um certo sabor romântico nos seus poemas. Através da sua poesia amorosa, de frequentes laivos petrarquistas e lirismo-subjetivo-objetivo, perpassa certa nota de amargura e desilusão - realidades provenientes do amor dedicado a Tirceia que ele viu solteira, viúva e casada pela segunda vez sem promessas de felicidade em comum. Recuperámos, pelos seus versos, este infeliz amor que assistiu a diversas juras quebradas, ao ciúme, à ansiedade de um encontro ou à dor da separação.

Os seus idílios e éclogas descrevem-nos belas cenas da vida amorosa de zagalas e pastoras, articuladas com os prazeres da vida rústica. Por outro lado, os seus sonetos apontam para temas como o amor platónico e a mutabilidade da Natureza em contraste com os seus sentimentos tristes imutáveis. (Daqui)
 

João Marques de Oliveira, Praia de banhos, Póvoa de Varzim, 1884


"A voz do mar é sedutora; nunca cessa, sussurrando, clamando, murmurando, convidando a alma a vaguear por um feitiço em abismos de solidão; se perder em labirintos de contemplação interior. A voz do mar fala com a alma. O toque do mar é sensual, envolvendo o corpo suavemente, num abraço apertado!" - Kate Chopin (1851–1904), em "The Awakening" (1899).

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