Sonia Delaunay, Mercado no Minho, 1915
Esta é a Cidade
Esta é a Cidade, e é bela.
Pela ocular da janela
foco o sémen da rua.
Um formigueiro se agita,
se esgueira, freme, crepita,
ziguezagueia e flutua.
Freme como a sede bebe
numa avidez de garganta,
como um cavalo se espanta
ou como um ventre concebe.
Treme e freme, freme e treme,
friorento voo de libélula
sobre o charco imundo e estreme.
Barco de incógnito leme
cada homem, cada célula.
É como um tecido orgânico
que não seca nem coagula,
que a si mesmo se estimula
e vai, num medido pânico.
Aperfeiçoo a focagem.
Olho imagem por imagem
numa comoção crescente.
Enchem-se-me os olhos de água.
Tanto sonho! Tanta mágoa!
Tanta coisa! Tanta gente!
São automóveis, lambretas,
motos, vespas, bicicletas,
carros, carrinhos, carretas,
e gente, sempre mais gente,
gente, gente, gente, gente,
num tumulto permanente
que não cansa nem descansa,
um rio que no mar se lança
em caudalosa corrente.
Tanto sonho! Tanta esperança!
Tanta mágoa! Tanta gente!
Vida e Obra de Sonia Delaunay
Sonia Delaunay
Sonia Delaunay (nascida Sarah Stern, Gradizhsk, perto de Odessa, Ucrânia, 14 de novembro de 1885 — Paris, 5 de dezembro de 1979) foi uma pintora e designer russa-francesa. Em 1910 Sonia Delaunay casou em segundas núpcias com o artista francês Robert Delaunay.
Sonia Delaunay e Robert Delaunay
Admiradora dos pintores Vincent van Gogh e Paul Gauguin, assim como dos pintores “Fauvistas”, deles recebeu o gosto pela expressividade das cores luminosas.
Sonia Delaunay, Portrait of Philomene, 1907 (Fauvismo)
Sonia Delaunay realizou em 1911 a primeira obra abstrata. São dessa época os quadros "Tango", "Bal Bullier" e "Prismes Electriques".
Fugindo da Iª Guerra Mundial, o casal veio viver, juntamente com o filho Charles, para Vila do Conde entre o Verão de 1915 e inícios de 1917, numa casa a que chamaram La Simultané. Aí aprofundaram a amizade com os pintores Amadeo de Souza-Cardoso e Almada Negreiros. Esse breve ano e meio em Vila do Conde foi considerado por Sonia o seu período de vida mais feliz e no qual realizou importantes obras inspiradas na arte popular portuguesa. Até meados de 1916 o casal teve, em Vila do Conde, a companhia dos pintores Eduardo Viana e Samuel Halpert.
Sonia Delaunay, Bailarina de flamenco
O casal Delaunay também residiu em Madrid. Sonia foi um dos vultos maiores da Art Déco: desenhou moda, fez decoração de teatro, figurinos para bailados, nomeadamente para Diaghilev, criou tecidos e especialmente peças de mobiliário. Viveu em Paris de 1921 até falecer. Foi uma das mais representativas artistas da chamada arte abstrata e muito apreciada.
Sonia Delaunay, El follaje bordado
Sonia Delaunay, Rythme, 1938
Sonia Delaunay, Composition Red, Blue, Black, White, 1964
Sonia Delaunay, Composition for XXe Siecle, 1972
"Reduzimos a vida a esta insignificância... Construímos ao lado outra vida falsa, que acabou por nos dominar. Toda a gente fala do céu, mas quantos passaram no mundo sem ter olhado o céu na sua profunda, temerosa realidade? O nome basta-nos para lidar com ele."
Raul Brandão, Húmus
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