Morteza Katouzian, The Dead End (1981), Oil on canvas, 80x60 cm
Auto-retrato com a musa
1
vejo-me ao espelho: a cara
severa dos sessenta,
alguns cabelos brancos,
os óculos por vezes
já mais embaciados.
sobrancelhas espessas,
nariz nem muito ou pouco,
sinal na face esquerda,
golpe breve no queixo
(andanças da gilette).
ia a passar fumando
mais uma cigarrilha
medindo em tempo e cinza
coisas atrás de mim.
que coisas? tantas coisas,
palavras e objectos,
sentimentos, paisagens.
também pessoas, claro,
e desfocagens, tudo
o que assim se mistura
e se entrevê no espelho,
tingindo as suas águas
de um dúbio maneirismo
a que hoje cedo. e fico
feito de tinta e feio.
2
quem amo o que é que pode
fazer deste retrato?
nem sabê-lo de cor,
nem tê-lo encaixilhado,
nem guardá-lo num livro,
nem rasgá-lo ou queimá-lo,
mas pode pôr-se ao lado
e ter prazer ou pena
por nos achar parecidos
ou não achar. quem amo
não fica desenhado,
fica dentro de mim
e é quando mais me apago
e deixo de me ver
e apenas me confundo,
amador transformado
na própria coisa amada
por muito imaginar.
assim nem john ashberry,
nem o parmegianino,
nem espelho convexo,
nem mesmo auto-retrato.
só uma sombra que é
na sombra de quem amo
provavelmente a minha.
3
quem amo tem cabelos
castanhos e castanhos
os olhos, o nariz
direito, a boca doce.
em mais ninguém conheço
tal porte do pescoço
nem tão esguias mãos
com aro de safira,
nem tanta luz tão húmida
que sai do seu olhar,
nem riso tão contente,
contido e comovente,
nem tão discretos gestos,
nem corpo tão macio
quem amo tem feições
de uma beleza grave
e música na alma
flutua nas volutas
de um madrigal antigo
em ondas de ternura.
é quando eu sinto a musa
pousando no meu ombro
sua cabeça, assim
me enredo horas a fio
e fico a magicar.
1
vejo-me ao espelho: a cara
severa dos sessenta,
alguns cabelos brancos,
os óculos por vezes
já mais embaciados.
sobrancelhas espessas,
nariz nem muito ou pouco,
sinal na face esquerda,
golpe breve no queixo
(andanças da gilette).
ia a passar fumando
mais uma cigarrilha
medindo em tempo e cinza
coisas atrás de mim.
que coisas? tantas coisas,
palavras e objectos,
sentimentos, paisagens.
também pessoas, claro,
e desfocagens, tudo
o que assim se mistura
e se entrevê no espelho,
tingindo as suas águas
de um dúbio maneirismo
a que hoje cedo. e fico
feito de tinta e feio.
2
quem amo o que é que pode
fazer deste retrato?
nem sabê-lo de cor,
nem tê-lo encaixilhado,
nem guardá-lo num livro,
nem rasgá-lo ou queimá-lo,
mas pode pôr-se ao lado
e ter prazer ou pena
por nos achar parecidos
ou não achar. quem amo
não fica desenhado,
fica dentro de mim
e é quando mais me apago
e deixo de me ver
e apenas me confundo,
amador transformado
na própria coisa amada
por muito imaginar.
assim nem john ashberry,
nem o parmegianino,
nem espelho convexo,
nem mesmo auto-retrato.
só uma sombra que é
na sombra de quem amo
provavelmente a minha.
3
quem amo tem cabelos
castanhos e castanhos
os olhos, o nariz
direito, a boca doce.
em mais ninguém conheço
tal porte do pescoço
nem tão esguias mãos
com aro de safira,
nem tanta luz tão húmida
que sai do seu olhar,
nem riso tão contente,
contido e comovente,
nem tão discretos gestos,
nem corpo tão macio
quem amo tem feições
de uma beleza grave
e música na alma
flutua nas volutas
de um madrigal antigo
em ondas de ternura.
é quando eu sinto a musa
pousando no meu ombro
sua cabeça, assim
me enredo horas a fio
e fico a magicar.
Vasco Graça Moura
(mantida a grafia original)
Vasco Navarro da Graça Moura GCSE • GCIH (Foz do Douro, 3 de Janeiro de 1942 — Lisboa, 27 de Abril de 2014) foi um escritor, tradutor e político português.
Licenciado em Direito, pela Universidade de Lisboa onde colaborou na Quadrante (revista da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa iniciada em 1958), foi advogado entre 1966 e 1983. Após o 25 de Abril de 1974, aderiu ao Partido Social Democrata, sendo chamado a exercer os cargos de Secretário de Estado da Segurança Social (IV Governo Provisório) e dos Retornados (VI Governo Provisório).
Na década de 80 enveredou definitivamente pela carreira literária, que o havia de confirmar como um nome central da literatura portuguesa da segunda metade século XX.
Foi diretor da RTP2 (1978), administrador da Imprensa Nacional - Casa da Moeda (1979-1989), presidente da Comissão Executiva das Comemorações do Centenário de Fernando Pessoa (1988) e da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (1988-1995), diretor da revista Oceanos (1988-1995), diretor da Fundação Casa de Mateus, comissário geral de Portugal para a Exposição Universal de Sevilha (1988-1992) e diretor do Serviço de Bibliotecas e Apoio à Leitura da Fundação Calouste Gulbenkian (1996-1999). Foi deputado ao Parlamento Europeu, integrando o Grupo do Partido Popular Europeu, de 1999 a 2009.
Em janeiro de 2012, Vasco Graça Moura foi nomeado para a presidência da Fundação Centro Cultural de Belém pela Secretaria de Estado da Cultura, substituindo António Mega Ferreira.
Graça Moura foi uma das vozes mais críticas do Acordo Ortográfico, que considerava que apenas "serve interesses geopolíticos e empresariais brasileiros, em detrimento de interesses inalienáveis dos demais falantes de português no mundo".
Vasco Graça Moura morreu no dia 27 de Abril de 2014, em Lisboa, aos 72 anos, vítima de cancro.
No mesmo dia, Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro de Portugal, destacou o percurso político de Graça Moura e a sua atividade como "divulgador das letras portuguesas", afirmando que o escritor deixou um "vasto legado literário, marcado pela inspiração e pela dedicação à língua portuguesa, que enriqueceu como poucos, uma constante procura da identidade nacional e um clarividente pensamento sobre as raízes, a herança política e filosófica e o futuro da Europa", concluindo: "Portugal perdeu hoje um dos seus maiores cidadãos".
Obras publicadas:
Poesia
Modo Mudando (1963);
Semana Inglesa (1965);
O Mês de Dezembro e Outros Poemas (1976);
A Sombra das Figuras (1985);
Sonetos Familiares (1994);
Uma Carta no Inverno (1997);
Testamento de VGM (2001);
Antologia dos Sessenta Anos (2002);
Os nossos tristes assuntos (2006)
Ensaio
Luís de Camões: Alguns Desafios (1980);
Camões e a Divina Proporção (1985);
Sobre Camões, Gândavo e Outras Personagens (2000).
Romance
Quatro Últimas Canções (1987);
Partida de Sofonisba às seis e doze da manhã (1993);
A Morte de Ninguém (1998);
Meu Amor, Era de Noite (2001);
Enigma de Zulmira (2002).
Diário e Crónica
Circunstâncias Vividas (1995);
Contra Bernardo Soares e Outras Observações (1999).
Traduções (resumo)
Fedra, de Racine
Andromaca, de Racine
Berenice, de Racine
O Cid, de Corneille
A Divina Comédia, de Dante
Cyrano de Bergerac, de Edmond Rostand
O misantropo, de Molière
Sonetos, de Shakespeare
Galeria de Morteza Katouzian
Morteza Katouzian, Self-Portrait
(http://mortezakatouzian.com)
(http://mortezakatouzian.com)
Morteza Katouzian nasceu em 1943 em uma família de classe média do Teerão. Amava a pintura desde a infância e passava todo seu tempo pintando sem a ajuda de qualquer professor.
"Quando mostrei minhas pinturas na escola os professores se recusaram a acreditar que eram as minhas obras originais", declarou Katouzian.
Seus primeiros trabalhos profissionais foram cartazes, logotipos e capas de livros. Foi um dos fundadores do sindicato dos artistas gráficos do Teerão e chefe do conselho por 2 anos. Participou de várias exposições coletivas e realizou 4 exposições individuais.
Todas as suas exposições sempre foram as mais visitadas na história da arte do Irão devido à boa qualidade das obras expostas, refletindo seu afeto por seres humanos e por questões relacionadas às suas vidas, contendo uma certa melancolia no olhar sobre o mundo exterior.
Em sua última exposição, em Junho de 2008, composta por 94 obras, ele foi premiado com a citação da UNESCO pelos seus 50 anos dedicados à pintura e por 30 anos de ensinamento à juventude iraniana onde dezenas de pintores foram apresentados à sociedade artística em seu pequeno estúdio. Um de seus alunos mais talentosos foi Iman Maleki, o génio do realismo.
Morteza Katouzian já publicou quatro livros e cinco de suas pinturas estão no Museu de Arte do Teerã. Muitas de suas obras pertencem a colecionadores. (© obvious: http://lounge.obviousmag.org/
"Quando mostrei minhas pinturas na escola os professores se recusaram a acreditar que eram as minhas obras originais", declarou Katouzian.
Seus primeiros trabalhos profissionais foram cartazes, logotipos e capas de livros. Foi um dos fundadores do sindicato dos artistas gráficos do Teerão e chefe do conselho por 2 anos. Participou de várias exposições coletivas e realizou 4 exposições individuais.
Todas as suas exposições sempre foram as mais visitadas na história da arte do Irão devido à boa qualidade das obras expostas, refletindo seu afeto por seres humanos e por questões relacionadas às suas vidas, contendo uma certa melancolia no olhar sobre o mundo exterior.
Em sua última exposição, em Junho de 2008, composta por 94 obras, ele foi premiado com a citação da UNESCO pelos seus 50 anos dedicados à pintura e por 30 anos de ensinamento à juventude iraniana onde dezenas de pintores foram apresentados à sociedade artística em seu pequeno estúdio. Um de seus alunos mais talentosos foi Iman Maleki, o génio do realismo.
Morteza Katouzian já publicou quatro livros e cinco de suas pinturas estão no Museu de Arte do Teerã. Muitas de suas obras pertencem a colecionadores. (© obvious: http://lounge.obviousmag.org/
Morteza Katouzian, The Red Alert. (1980)
Morteza Katouzian, The Penitent (1981) oil on canvas, 70x50 cm
Morteza Katouzian, The Forgottens (1996)
Morteza Katouzian, Exhausted from Work. (1997)
"Eu nunca poderia parar de pintar. O meu coração é como um espelho refletindo a realidade do mundo circundante."
(Morteza Katouzian)
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