sexta-feira, 29 de outubro de 2021

"Tem a Virtude o Prémio" - Poema de Filinto Elísio


 
 
 
Tem a Virtude o Prémio


Tardio às vezes, sempre merecido,
Tem a Virtude o prémio aparelhado
Ao profícuo talento, ao peito honrado,
Que do dever o estádio tem corrido.

O Sábio, que dos louros esquecido
Só no obrar bem os olhos tem cravado
Inopino também se acha coroado
Por mãos soberanas com o laurel devido

Útil à Pátria seja, as paixões dome,
Seja piedoso, honesto, afável, justo;
Que no futuro o espera ínclito nome.

Assim falou Minerva ao Coro augusto,
Pondo no Templo do imortal Renome,
De glória ornado, o teu prezado Busto.

 
 
 
 Filinto Elísio - Poesias. Selecção, prefácio e notas do Prof. José Pereira Tavares. 
Livraria Sá da Costa - Editora. Lisboa. (1941). (Daqui)
 
 
Filinto Elísio
 
Filinto Elísio (Lisboa, 23 de Dezembro de 1734 – Paris, 25 de Fevereiro de 1819), pseudónimo do Padre Francisco Manuel do Nascimento, foi um dos mais importantes poetas do Neoclassicismo português. 
Oriundo de uma família humilde - o pai era fragateiro e a mãe era peixeira, naturais de Ílhavo -, estudou e recebeu ordens sacras graças à proteção de um embarcadiço de mais largos recursos económicos. Integrou-se, mais tarde, num pequeno círculo de comerciantes letrados, no qual se encontravam alguns franceses que, provavelmente, exerceram influência notável na sua formação iluminista e liberal. Por esta altura, participou da guerra dos poetas, inscrevendo-se no grupo da Ribeira das Naus, que se opôs à Arcádia Lusitana. Foi neste conflito que, sob o nome de Niceno, propugnou a imitação do bom modelo clássico e o exemplo dos Quinhentistas.
No convento de Chelas, travou Francisco Manuel do Nascimento conhecimento com as duas filhas do Marquês de Alorna, tendo sido professor de latinidade de D. Leonor de Almeida, futura marquesa de Alorna, da qual recebeu o nome arcádico, e mestre de música de sua irmã, D. Maria de Almeida, a quem cortejou muito em verso. 
Apesar de ser clérigo, teve de fugir para França, exilando-se em Paris em 1778, pelo facto de ler livros racionalistas franceses proibidos pela Inquisição. Aí estabeleceu relações de amizade com o poeta Lamartine, que lhe dedicou um poema. 
À exceção de uma estadia de quatro anos em Haia, viveu o resto da vida neste país, compondo em prol da estética horaciana e dos problemas da longínqua pátria perante os rumos abertos pelas revoluções americana e francesa. 
A França era, para Filinto Elísio, a imagem da civilização e foi, sem dúvida, através do contacto com os primeiros românticos franceses que ele, para lá do neoclassicismo horaciano, chegou, por vezes, a exprimir-se numa linguagem de livre confessionalismo pré-romântico. Mas foi sobretudo na ideologia das luzes que este poeta mais vivamente mergulhou, servindo um classicismo arcádico que se harmonizava com a simbologia e os gostos neoclássicos da revolução. (Daqui)
 
 
Obras Completas
 
A obra de Filinto Elísio compreende todo o vasto receituário clássico - odes, epigramas, cartas, enigmas, epinícios, epicédios, etc. - em que o poeta revela as suas emoções mais sentidas. O verso de Filinto é duro, trabalhado e arcaizante. Por outro lado, a sua prosa, que se encontra espalhada, em notas variadas, por todas as suas obras, denota uma grande diversidade de recursos, prejudicados, por vezes, pelo excessivo zelo purista do idioma. Foi um escritor apegado a certos processos que considerava "quinhentistas", mas que são, em parte, "seiscentistas", nomeadamente os hipérbatos e a expressividade do vernaculismo vocabular.
Já quase no fim da vida, Filinto Elísio registou algumas normas e conceitos acerca da poesia e da língua na Epístola Da Arte Poética Portuguesa, dirigida a José Maria de Brito. Nesta carta defende, fundamentalmente, o verso branco e a liberdade de pensamento a ele associada, a valentia da expressão, a pureza e o francesismo do léxico e a sua renovação sobre base quinhentista e latina. Dá origem a uma orientação estética chamada de Filintismo, adversária da fluência fácil do Elmanismo, que aponta para os cânones horacianos, para o exemplo de Garção e para o formalismo arcádico de que é o último e digno representante. A Elísia pátria de Filinto é tipicamente quinhentista, com os seus diversos heróis, dos quais Camões é o expoente máximo, cantados à maneira arcádica com uma grande pureza formal.
Fiel a este movimento arcádico, Filinto revela-se, porém, pelo egocentrismo de algumas das suas líricas, pela sua revolta e pelo entusiasmo relativo às ideias iluministas, um precursor do movimento romântico. Exprime nas suas odes, nas suas epístolas e nas suas sátiras, todo o alvoroço do seu tempo - descreve-nos a sua situação de exilado, as faltas de dinheiro; insurge-se contra o obscurantismo clerical; canta veementemente a liberdade, a tomada da Bastilha, Washington e a independência americana e todos os defensores do progresso e do domínio da Natureza.
Este é um poeta aristocraticamente letrado no seu discurso, mas burguês e plebeu no que respeita aos temas e ao léxico, o que se manifesta no seu apego gastronómico aos ovos-moles, às trouxas de ovos, às morcelas, aos melões e na rememoração de festas populares ao ar livre e de uma hilariedade pagã. 
A obra de Filinto Elísio tem sido estudada por Fernando Alberto Torres Moreira, professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (tese de mestrado com o título "O Epigrama em Filinto Elísio - Um Género para um Poeta", 1995). 
Têm vindo a ser publicadas desde 1998 as Obras Completas de Filinto Elísio. Fernando Moreira, professor da UTAD, com o apoio do Ministério da Cultura e do Instituto Português do Livro e da Leitura, coordena atualmente a reedição das mesmas. Foram publicados até ao momento quatro volumes (Filinto Elísio: Obras Completas, coleção Clássicos da Literatura Portuguesa, Braga, Edições APPACDM, 1998-1999. Edição de Fernando Moreira). (Daqui)
 

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