domingo, 5 de novembro de 2023

"Convalescença" - Poema de Miguel Torga


Helene Schjerfbeck (Finnish painter, 1862–1946), The Convalescent, 1888 (Naturalism),
Ateneum, Helsinki, Finland



Convalescença

 
Hora a hora,
Nasce outra vez em mim a vida.
Devagar,
Como um gomo de vide a rebentar,
Cobre de verde a cepa ressequida.

É um fruto que acena?
É uma flor que há de ser?
— Fui eu que disse que valia a pena

Viver!


(Coimbra, 14 de Fevereiro de 1943)

Miguel Torga (1907-1995), in Diário II
 
 
Helene Schjerfbeck, A Boy Feeding His Little Sister, 1881, Ateneum, Helsinki


"As crianças – todas as crianças -, eu lhes asseguro, estão dispostas à aventura da aprendizagem inteligente. Estão cansadas de serem tratadas como subdotadas ou como adultos em miniatura. Elas são o que são e têm o direito de serem o que são: seres naturalmente mutáveis, porque aprender e mudar é a sua forma de ser no mundo." 
 
Emilia Ferreiro, no livro “Reflexões sobre Alfabetização”
 

 
"Por trás da mão que pega o lápis, dos olhos que olham, dos ouvidos que escutam, há uma criança que pensa. Essa criança que pensa não pode ser reduzida a um par de olhos, de ouvidos, e uma mão que pega o lápis. Ela pensa o propósito da língua escrita. O processo de alfabetização nada tem de mecânico, do ponto de vista da criança que aprende."

Emilia Ferreiro, “Reflexões sobre Alfabetização”
 

Emilia Ferreiro,“Reflexões sobre Alfabetização
 
 
 Resumo
 
Emília Ferreiro descobriu e descreveu a 'psicogénese da língua escrita' e abriu espaço para um novo tipo de pesquisa em pedagogia. Ela desloca a investigação do 'como se ensina' para 'o que se aprende'. O processo de alfabetização nada tem de mecânico, do ponto de vista da criança que aprende. A criança constrói seu sistema interpretativo, pensa, raciocina e inventa buscando compreender esse objeto social complexo que é a escrita. Essa mudança conceitual sobre alfabetização acaba levando a mudanças profundas na própria estrutura escolar.
 
 
Emilia Ferreiro (daqui)
 
 
Emilia Ferreiro
 
Em 1970 depois de se formar em psicologia pela Universidade de Buenos Aires, estudou na Universidade de Genebra, onde trabalhou como pesquisadora-assistente de Jean Piaget e obtém o seu PhD sob a orientação do psicopedagogo suiço. Retornou a Buenos Aires, em 1971. Formou um grupo de pesquisa sobre alfabetização e publicou sua tese de doutorado - Les relations temporelles dans le langage de l'enfant. No ano seguinte, recebeu uma bolsa da Fundação Guggenheim (EUA). Em 1974 afastou-se de suas funções docentes na Universidade de Buenos Aires. Em 1977, após o golpe de Estado na Argentina passou a viver em exílio na Suíça, lecionando na Universidade de Genebra. 
Iniciou com Margarita Gómez Palacio uma pesquisa em Monterrey (México) com crianças que apresentam dificuldade de aprendizagem. Em 1979 passou a residir no México com o marido, o físico e epistemólogo Rolando García, com quem teve dois filhos. Foi Professora Titular do Centro de Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional, na Cidade do México. 
No Brasil, Emília teve enorme influência na educação, a divulgação de seus livros, a partir de meados dos anos 1980, causou um grande impacto sobre a conceção que se tinha do processo de alfabetização, influenciando as próprias normas do governo para a área, expressas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. 
As obras de Emilia - Psicogénese da Língua Escrita é a mais importante - não apresentam nenhum método pedagógico, mas revelam os processos de aprendizado das crianças, levando a conclusões que puseram em questão os métodos tradicionais de ensino da leitura e da escrita. Emilia Ferreiro tornou-se uma espécie de referência para o ensino brasileiro e seu nome passou a ser ligado ao construtivismo, campo de estudo inaugurado pelas descobertas a que chegou o biólogo suíço Jean Piaget na investigação dos processos de aquisição e elaboração de conhecimento pela criança - ou seja, de que modo ela aprende. As pesquisas de Emilia Ferreiro concentram o foco nos mecanismos cognitivos relacionados à leitura e à escrita.
Tanto as descobertas de Piaget como as de Emilia levam à conclusão de que as crianças têm um papel ativo no aprendizado. Elas constroem o próprio conhecimento, por isso a palavra construtivismo. A principal implicação dessa conclusão para a prática escolar é transferir o foco da escola e da alfabetização em particular do conteúdo ensinado para o aluno. Até então, os educadores só se preocupavam com a aprendizagem quando a criança parecia não aprender, Emília Ferreiro inverteu essa ótica.
O princípio de que o processo de conhecimento por parte da criança deve ser gradual corresponde aos mecanismos deduzidos por Piaget, segundo os quais cada salto cognitivo depende de uma assimilação e de uma reacomodação dos esquemas internos, que necessariamente levam tempo. É por utilizar esses esquemas internos, e não simplesmente repetir o que ouvem, que as crianças interpretam o ensino recebido. No caso da alfabetização isso implica uma transformação da escrita convencional dos adultos. Para o construtivismo, nada mais revelador do funcionamento da mente de um aluno do que seus supostos erros, porque evidenciam como ele "releu" o conteúdo aprendido. O que as crianças aprendem não coincide com aquilo que lhes foi ensinado.
Com base nesses pressupostos, Emilia Ferreiro critica a alfabetização tradicional, porque julga a prontidão das crianças para o aprendizado da leitura e da escrita por meio de avaliações de perceção (capacidade de discriminar sons e sinais, por exemplo) e de motricidade (coordenação, orientação espacial etc.).
Dessa forma, dá-se peso excessivo para um aspeto exterior da escrita (saber desenhar as letras) e deixa-se de lado suas características conceituais, ou seja, a compreensão da natureza da escrita e sua organização. Para os construtivistas, o aprendizado da alfabetização não ocorre desligado do conteúdo da escrita.
É por não levar em conta o ponto mais importante da alfabetização que os métodos tradicionais insistem em introduzir os alunos à leitura com palavras aparentemente simples e sonoras (como babá, bebé, papa), mas que, do ponto de vista da assimilação das crianças, simplesmente não se ligam a nada. Segundo o mesmo raciocínio equivocado, o contacto da criança com a organização da escrita é adiado para quando ela já for capaz de ler as palavras isoladas, embora as relações que ela estabelece com os textos inteiros sejam enriquecedoras desde o início.Segundo Emilia Ferreiro, a alfabetização também é uma forma de se apropriar das funções sociais da escrita. De acordo com suas conclusões, desempenhos díspares apresentados por crianças de classes sociais diferentes na alfabetização não revelam capacidades desiguais, mas o acesso maior ou menor a textos lidos e escritos desde os primeiros anos de vida.
Uma das principais consequências da absorção da obra de Emilia Ferreiro na alfabetização é a recusa ao uso das cartilhas, uma espécie de bandeira que a psicolinguista argentina ergue. Segundo ela, a compreensão da função social da escrita deve ser estimulada com o uso de textos de atualidade, livros, histórias, jornais, revistas. Para a psicolinguista, as cartilhas, ao contrário, oferecem um universo artificial e desinteressante. Em compensação, numa proposta construtivista de ensino, a sala de aula se transforma totalmente, criando-se o que se chama de ambiente alfabetizador. (daqui)

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