
Luciano dos Santos (Pintor e professor português, 1911 - 2006),
"Praça de Bocage" (Setúbal), 1952.
Paisagem Citadina
A pele por fulgurantes
instantes muitas vezes abre-se até onde
seria impensável que exercesse
com tão grande rigor o seu domínio.
Não temos então dela senão rápidas
visões, onde os reclames
do coração se cruzam, solitários
e agrestes, refletidos
por trás nos ossos empedrados.
Em certas posições veem-se as cordas
do nosso espírito esticadas num terraço.
A roupa dói-nos porque, embora
nos cubra a pele, é dentro
do espírito que estão os tecidos amarrados.
Luciano dos Santos, "Doca de Setúbal", 1970.
O azul do mar
O azul do mar desprende-se da água.
Dos ossos que cravei na realidade, onde pensava
que o mar se sustivesse e da qual sempre
supus também que o mar se alimentasse (de tal forma
por vezes o sentimos
encher-se de realismo), nem um só, mesmo pintado,
subsiste agora
que o tempo tudo apaga à minha volta.
Luís Miguel Nava, in 'O Céu sob as Entranhas',
Porto: Limiar, 1989.
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