quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

"Ainda há pouco prometiam o vento" - Poema de Nuno Júdice


Thomas Cole (English-born American artist and the founder of the Hudson River School art movement,
 1801–1848), The Oxbow, View from Mount Holyoke, Northampton, Massachusetts,
 after a Thunderstorm, 1836. The Metropolitan Museum of Art, New York.
 


Ainda há pouco prometiam o vento

 
Ainda há pouco prometiam o vento
para amanhã; e a chuva, que vem com o vento,
pode vir também amanhã, quando o céu carregado
de nuvens atravessar o continente, em
direção não sei aonde. E onde irei eu
estar, amanhã, quando essas nuvens tiverem
desaparecido, e só as árvores
com os ramos partidos lembrarem que o
vento lhes roubou as folhas? É possível que
eu possa vir a estar entre essas folhas,
ou debaixo delas, espessas com a humidade
da terra, como se fossem um manto; mas
não sei se era isso que o vento me queria dizer
quando me falava, por entre as frinchas da
porta, e só os ruídos secretos da noite
lhe respondiam. Talvez por isso, deixei-me
ficar acordado. Nem sempre se podem ouvir
esses diálogos; nem adivinhar, na manhã
futura, o destino previsível de um ser.


Nuno Júdice, in "Meditação sobre ruínas", 1995. 
 

Sem comentários: