quarta-feira, 25 de setembro de 2024

"Diz-me tudo" - Poema de Nuno Júdice


Harald Slott-Møller (Danish painter and ceramist, 1864 –1937), Summer Day, 1888.
Models: Danish painters Agnes Slott-Møller (1862–1937) and Marie Krøyer (1867–1940).
 


Diz-me tudo 
 

Há uma regra inflexível no amor: o seu horizonte
tem a vastidão do mar, para lá do qual outros
horizontes se abrem se o muro, ao longo da
praia, não impuser os seus limites a quem
deseja a viagem. O espírito, porém, seguindo
um rumo platónico, voa sobre as ondas,
afastando-se da apressada respiração das marés;
e é no alto, onde se confundem nuvens e
gaivotas, que o olhar descobre a imensidão
do oceano para que o sentimento o empurra,
se não houver pela sua frente um porto,
ou uma ilha, que ponham fim à navegação.

Mas estas são apenas as convenções que
obrigam a imaginação; porque se o amor se
libertar das palavras que o oprimem, dando
ao corpo a mesma plenitude que se encontra
neste mar, está aberto o caminho para o abismo
em que o ser se dilui no puro espaço, onde
só o azul existe. Então, os dedos tocam
o teclado do infinito, e ouvir-se-á a música
dos murmúrios que nenhum ouvido recebe
se os sons da terra o magoam. E é como
se o dia durasse, para além do tempo e
das coisas da vida, até ao fim do mundo.


Nuno Júdice
, "A Pura Inscrição do Amor", 2018

 
Nuno Júdice, "A Pura Inscrição do Amor"
Ano de Edição / Impressão: 2018 
Publicações Dom Quixote 
 
 
SINOPSE


"A Pura Inscrição do Amor" reúne poemas que Nuno Júdice escreveu ao longo dos anos e que são dedicados a este tema.
Nele se incluem, a abrir, os conjuntos de poemas "Pedro, Lembrando Inês" e "Carta de Orfeu a Eurídice", ambos publicados em simultâneo em Abril de 2001 sob o título "Pedro, Lembrando Inês", que se encontrava esgotado há muito tempo.
Os poemas reunidos em "Novo Tratado de Pintura" são inéditos em Portugal embora alguns deles tenham sido publicados na Colômbia, em 2014, sob o título, "Breve Tratado de Pintura" (Frailejón Editores).
Por sua vez, "Cântico" teve uma edição em livro de artista em Espanha, em 2015, sob o título "Cântico dos Cânticos" (versão livre), com ilustrações do pintor Pedro Castrortega (Segundo Santos Ediciones).
Em ambos os casos, esta é a sua primeira edição em Portugal.
O poema "A Mulher Deitada", que fecha o livro, é inédito.
Um belíssimo livro para ler, oferecer e guardar. (daqui)
 


Harald Slott-Møller, Georg Brandes at the University in Copenhagen, 1889.
 
 
 Georg Brandes
 
 
Crítico e estudioso dinamarquês, Georg Morris Cohen Brandes nasceu a 4 de fevereiro de 1842, em Copenhaga. Oriundo de uma família da classe média judaica, não foi contudo educado no ambiente religioso que é característico deste grupo étnico. Estudou na Universidade de Copenhaga, resolvendo nesse período da sua vida uma crise de valores com que se havia deparado ao tomar conhecimento com a obra de Kierkegaard. Recebeu o seu diploma em Estética em 1964, tornando-se depois leitor e crítico de teatro.
Publicou os seus primeiros escritos em Æsthetiske Studier (1868, Estudos Estéticos) e Kritiker Og Portraiter (1870). Em 1870 apresentou a sua tese de doutoramento, dedicada ao tema da Estética francesa, com especial incidência no pensamento de Taine, que o havia deslocado da Filosofia hegeliana, mas mantendo a opinião de que o génio não era uma manifestação do Zeitgeist, o espírito dos tempos.
A 3 de novembro de 1871 começou a apresentar um ciclo de conferências que marcaram profundamente os meios culturais dinamarqueses e escandinavos. Neste ciclo, intitulado Høvedstrømminger I Det 19De Aarhundredes Litteratur, e publicado posteriormente em seis volumes entre 1872 e 1887, Brandes afirmava que a Dinamarca estava cerca de quarenta anos atrasada em relação ao resto da Europa, defendendo portanto uma orientação para o modernismo na reforma da sociedade. Mal acolhidas nos círculos conservadores, trouxeram a Brandes uma reação hostil, que se manifestou na destituição da cadeira de Estética na Universidade de Estocolmo, que lhe havia sido prometida. Entre 1870 e 1871 Brandes havia viajado pela Europa, tendo visitado a Inglaterra, a Itália e a França, deixando-se impressionar pelo clima mediterrânico e pela arte renascentista.
De 1874 a 1877 publicou a revista Det Nittende Aahundrede, em parceria com o seu irmão Edvard Brandes e, com o fracasso desta publicação, abandonou a Dinamarca para ir viver para Berlim, onde esteve durante cinco anos. Aí preparou a gestação do pensamento a que os filósofos iriam chamar de Brandesianismo. Publicou, durante este período, monografias, de que se destacam Benjamin Disraëli (1879) e Ferdinand Lassalle (1881).
Tornando-se a figura de vanguarda do movimento naturalista da literatura escandinava, e estabelecendo contacto com nomes com August Strindberg, Henrik Ibsen e Bjørnstjerne Bjørnson, teve discípulos significativos, como Jens Peter Jacobsen.
Em 1888, num outro ciclo de conferências, apresentou a sua interpretação do pensamento do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, que o desprezou. Brandes considerava os génios como os melhores produtos de uma civilização avançada. Publicou biografias de grandes figuras históricas, como William Shakespeare, Goethe, Voltaire, Júlio César e Michelangelo.
Na fase final da sua vida viajou extensivamente. Foi-lhe dada uma cadeira na Universidade de Copenhaga, em reconhecimento pelos seus trinta anos de serviço. Manteve-se, porém, uma figura controversa quando se opôs à Primeira Grande Guerra e professou o seu ceticismo religioso. Recebeu, portanto, protestos com a publicação de Sagnet Om Jesus (1925).
Faleceu a 19 de fevereiro de 1927. (daqui)
 

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