sexta-feira, 27 de setembro de 2024

"A gata" - Poema de Francisco Umbral


Bruno Liljefors (Swedish wildlife painter, 1860 –1939), Cat on flowerbed, 1887.
 
 

A gata


A gata apanha peixe quando pode.
Peixe roubado, porque é uma ladra.
Se não, não seria gata, nem tão hábil.
A gata dorme ao sol, dorme à sombra,
ou sobre o grande louceiro da sala.
A gata é um sistema de defesa,
olhos que veem crescer a erva
quando não há erva nenhuma
nem nada que cresça.
A gata abana o rabo,
radar de veludo,
controlando a noite que deixa atrás de si.
Dormiu dez sóis sucessivos
e agora estrangula urracas em copas de árvores,
tão ágil que amedronta,
e emana no escuro a sua luz roubada.

Amo a minha gata, que é mimada,
vigio-lhe as garras criminosas
e ela esconde as unhas,
inocente,
como uma imperatriz que guarda a sua adaga.
A minha gata tem muita biografia,
os animais nunca se aborrecem,
mas também não sonha fantasias,
embora beba, pouco a pouco, o cloro verde
da imensa piscina que a olha,
e depois, junto a mim, vê televisão,
e volta a dormir mais vinte horas. 
 
 
Francisco Umbral
, Obra Poética (1981-2001),
Tradução de Carlos Vaz Marques 
 
 
Francisco Umbral (daqui)

 
Escritor, jornalista e ensaísta espanhol, Francisco Umbral, nascido a 11 de maio 1932, em Madrid, e falecido na mesma cidade a 28 de agosto de 2007, é autor de uma vasta obra literária que lhe proporcionou distinções como o Prémio Príncipe das Astúrias e o Prémio Cervantes.
Na infância viveu em Valladolid e entrou muito tarde para a escola. Aos dez anos, foi expulso por mau comportamento e não retomou os estudos institucionais, tendo começado a trabalhar aos 14 anos. No entanto, por ter um grande interesse na leitura, acabou por se revelar um autodidata.
Entretanto, ainda em Valladolid começou a escrever artigos para a revista Cisne, assim como a assistir a sessões de poesia e a conferências. Aos 26 anos, deu início à sua carreira de jornalista no El Norte de Castela, passando depois pela rádio La Voz de León e pelos jornais Proa e El Diário de León.
Em 1961, mudou-se para Madrid, onde conheceu o escritor Camilo José Cela, graças ao qual veio a publicar os seus primeiros livros. Da sua vasta obra destacam-se livros como Mortal e Rosa, E Como Eram as Ligas de Bovary? e Madrid, editados em Portugal, assim como Las Ninfas, El Carnívoro Cuchillo, Trilogía de Madrid, La Leyenda del César Visionário e El Hijo de Greta Garbo.
Umbral dedicou-se igualmente a escrever ensaios biográficos e literários sobre autores famosos, como Federico Garcia Lorca e Lord Byron.
Paralelamente escreveu em diversas publicações, destacando-se as crónicas no El País, Diario 16 e El Mundo. Grande parte das suas crónicas foi posteriormente reunida em diversas coletâneas.
Em 1981, tentou a poesia com a obra Crímenes y baladas e, quatro anos mais tarde, começou a lançar uma série de obras sobre os feitos mais importantes da história de Espanha do século XX.
Ao longo da sua carreira, Umbral ganhou diversos galardões literários e de jornalismo, entre os quais se destacam o Prémio Nadal de 1975, com Las Ninfas, o Prémio Príncipe das Astúrias de Literatura de 1996, o Prémio Nacional das Letras Espanholas em 1997 e o Prémio Cervantes em 2000.
Francisco Umbral morreu a 28 de agosto de 2007, com 75 anos, num hospital de Madrid, com uma falha cardiorrespiratória. (daqui)
 
 
Bruno Liljefors, Cat hunting Birds, 1883, Gothenburg Museum of Art.
 
 
"Acredito que gatos são espíritos vindos para a Terra. Tenho certeza de que um gato andaria nas nuvens sem cair." 
 
 
 

Bruno Liljefors, Jeppe the Cat in the spring sun, 1886, Private Collection.
 
 
"Sempre me dá um calafrio quando eu vejo um gato que vê o que eu não posso ver." 

Eleanor Farjeon
, Faithful Jenny Dove: and other illusions‎ - Página 57.
Publicado por M. Joseph, 1963 - 159 páginas.
 

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