Constance Rea (British painter, c.1866–1952), Girl with a Mandolin, oil on canvas,
As Adolescentes
A pele mosqueada da maçã reineta,
um ar vago e doce, feliz.
Subitamente correm como rapazes,
são a corda do arco
que se dilata e a seta do corpo
chega aos quinze anos,
quando abrem as ancas
e amam como se fossem mães.
um ar vago e doce, feliz.
Subitamente correm como rapazes,
são a corda do arco
que se dilata e a seta do corpo
chega aos quinze anos,
quando abrem as ancas
e amam como se fossem mães.
in 'A Raiz Afectuosa'
A Raiz Afetuosa
'A Raiz Afetuosa' reúne
uma atividade poética que, estética e ideologicamente formada nos anos
50 e datada dos anos de 1965 a 1971, só foi publicada em volume no
início dos anos 70. É assim que este livro de estreia, A Raiz Afetuosa, de António Osório,
publicado em 1972, evocando afetos familiares e a solidariedade com
todos os seres, animais ou plantas, numa voz aparentemente alheia ao
percurso de fuga simultaneamente ao real e à subjetividade efetuado por
vários poetas contemporâneos, surge como um caso singular no panorama
literário em que se revela. Insólita, por natural, é nesta obra "a raiz
afetuosa" que une o poeta a tudo o que vive e que ama, para além da vida
e da morte, polos, aliás, relativos - "nem a vida cessa nem a morte
sepulta" («Argos», in A Ignorância da Morte) -, quando o poema ressuscita os mortos («Dante», «Elegia»,
«In Memoriam», «Maiakovski»), quando indaga na natureza a muda
testemunha que sobrevive ao tempo («A um Mirto»), quando renasce nos
seus filhos ou desafia os "Vindouros", descortinando acima da caducidade
e da efemeridade uma lógica superior pela qual "As marés chegam e
partem, / tudo morre e começa (o vento, / o tumulto dos cais, a luta dos
homens)" («Tejo, 26 de junho»). Mas, no espaço de uma poesia filha do
modernismo, como é toda a poesia contemporânea, onde "um canto enraizado
no ritmo imemorial do coração só pode ser «ingénuo» em segundo grau"
(cf. LOURENÇO, Eduardo, p. 7), a reconciliação com a vida e com a
simplicidade subtrai-se à prática romântica de um subjetivismo
sentimental e óbvio, por um misto de "ternura" e "lucidez amarga" (idem,
p. 10) que neutraliza a comoção, por uma espécie de "ironia que se
transmuda em piedade, de repúdio, suma de montanhas e montanhas
sobrepondo-se, de esconjurar a crueldade e, ainda de trazer consigo,
piedosamente, a chave do jazigo de Deus" (cf. OSÓRIO, A. - «Dedicatória a meu tio Henrique», in Décima Aurora).
No mesmo sentido, a depuração da escrita, característica que comunga
com outros poetas revelados nos anos 60 e 70, como forma de uma lírica
de regresso à celebração das coisas elementares, é, em António Osório,
colocada, pela redução de figuras e de adjetivos e pela submissão da
frase a processos elípticos, ao serviço, não da expressão obscura e
crítica, mas de uma sobriedade pela qual a evidência se sobrepõe ao
enigma (cf. LOURENÇO, ibid., p. 15), na conquista de uma essencial "humildade discursiva" (MAGALHÃES, Joaquim Manuel - prefácio a Décima Aurora, 1982). (Daqui)
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