segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

"Como quem num dia de Verão abre a porta de casa" - Poema de Alberto Caeiro / Fernando Pessoa


  Victor Westerholm (Finnish landscape painter, 1860-1919), Scene from Hirvensalo, 1903 
 


   Como quem num dia de Verão abre a porta de casa

 
Como quem num dia de Verão abre a porta de casa
E espreita para o calor dos campos com a cara toda,
Às vezes, de repente, bate-me a Natureza de chapa
Na cara dos meus sentidos,
E eu fico confuso, perturbado, querendo perceber
Não sei bem como nem o quê...

Mas quem me mandou a mim querer perceber?
Quem me disse que havia que perceber?

Quando o Verão me passa pela cara
A mão leve e quente da sua brisa,
Só tenho que sentir agrado porque é brisa
Ou que sentir desagrado porque é quente,
E de qualquer maneira que eu o sinta,
Assim, porque assim o sinto, é que é meu dever senti-lo... 

s.d. 
 
Alberto Caeiro,O Guardador de Rebanhos”.
 In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa. 
 (Nota explicativa e notas de João Gaspar Simões e Luís de Montalvor.) 
Lisboa: Ática, 1946 (10ª ed. 1993). - 48.
 
 
Portrait of Victor Westerholm (Finnish landscape painter, 1860-1919), 1901
by Raffaello Gambogi (Italian painter, 1874-1943)


"If I could say it in words there would be no reason to paint."

Edward Hopper
 
 (American realist painter and printmaker, 1882-1967)
 
 
 
 
"Eu vou para a natureza para ser acalmado e curado, e para colocar meus pensamentos em ordem."

 
[John Burroughs (1837 - 1921) foi um naturalista norte-americano e ensaísta da natureza, ativo no movimento conservacionista  nos Estados Unidos. A primeira de suas coleções de ensaios foi Wake-Robin em 1871.] 
 
 
Victor Westerholm, Kymi River, 1902, (Landscape Art), Lappeenranta Art Museum
 

Naturalismo
 
Movimento estético-literário da segunda metade do século XIX, estreitamente relacionado com o Realismo, de que retoma a necessidade da observação objetiva da realidade e as preocupações socioculturais, acentuando, contudo, os seus pressupostos ideológicos e científicos. 
O Naturalismo relaciona-se intimamente com as transformações sociais e as novas correntes filosóficas e científicas do século XIX: o positivismo de Augusto Comte (1798-1857), teoria sociológica que defendia a necessidade da tomada de consciência das relações entre o indivíduo e a sociedade como condição para o progresso civilizacional; o determinismo de Hippolyte Taine (1828-1893), segundo o qual a obra era produto das influências da raça, do meio e do momento histórico; o experimentalismo de Claude Bernard (1813-1878). Estas doutrinas foram aplicadas à literatura pelo romancista francês Émile Zola (1840-1902), que expôs, na coletânea de artigos Le Roman expérimental (1880), a teoria do romance naturalista, concretizando-a nos vinte volumes da série Les Rougon-Macquart. Segundo Zola, o romance deveria explicar a decadência social mediante a demonstração de teses científicas.
A receção crítica da teoria naturalista de Zola fez-se em Portugal por intermédio de autores como Júlio Lourenço Pinto (1842-1907), José António dos Reis Dâmaso (1850-1895), António José da Silva Pinto (1848-1911) e Alexandre da Conceição (1842-1889). Esses, e outros como Teixeira de Queirós (1848-1919), autor das séries Comédia do Campo e Comédia Burguesa, Abel Botelho (1854-1917), criador do políptico Patologia Social, ou Carlos Malheiro Dias (1875-1941) tentariam a aplicação do Naturalismo ao conto e ao romance. Mais complexo é o caso de Eça de Queirós (1845-1900), que em 1871 profere a conferência "O Realismo como nova expressão da Arte", com claras influências da doutrina de Zola e sobretudo do determinismo de Taine, e a dado momento se aproxima do autor de Le Roman expérimental ao orientar o romance para uma atitude científica e objetiva, mas acaba por se demarcar do Realismo-Naturalismo, constituindo um caso único na nossa literatura. (Daqui)
 

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