sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

"A Festa do Silêncio" - Poema de António Ramos Rosa


Winslow Homer (American painter, photographer, printmaker and illustrator, 1836 - 1910),  
Crossing the Pasture, 1871–72, Amon Carter Museum of American Art.
 
[Children were seen as a poignant symbol of the nation’s future in the years following the Civil War, because of its devastating death toll. Homer was one of many artists and writers, including Mark Twain and Louisa May Alcott, who celebrated the "cult of childhood" in their work. While Homer’s charming vignette commemorates youthful innocence in an idyllic rural landscape, a sense of disquiet seeps into the picture. The figures, standing close together, wear uneasy expressions, with the older boy seeming to serve as a protective presence in relation to his young charge. The source of their apprehension is visible in the distance at left: a bull that seems to have noticed their attempt to traverse the field.] (daqui)
 

A Festa do Silêncio 
 
Escuto na palavra a festa do silêncio.
Tudo está no seu sítio. As aparências apagaram-se.
As coisas vacilam tão próximas de si mesmas.
Concentram-se, dilatam-se as ondas silenciosas.
É o vazio ou o cimo? É um pomar de espuma.

Uma criança brinca nas dunas, o tempo acaricia,
o ar prolonga. A brancura é o caminho.
Surpresa e não surpresa: a simples respiração.
Relações, variações, nada mais. Nada se cria.
Vamos e vimos. Algo inunda, incendeia, recomeça.

Nada é inacessível no silêncio ou no poema.
É aqui a abóbada transparente, o vento principia.
No centro do dia há uma fonte de água clara.
Se digo árvore a árvore em mim respira.
Vivo na delícia nua da inocência aberta. 


António Ramos Rosa
, in "Volante Verde" 
 

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