sábado, 19 de outubro de 2024

"A Vida" - Poema de Nuno Júdice



Cristiano Banti
 (Italian painter, 1824–1904), Alaide Banti in the garden, c. 1870.
Private Collection



A Vida 
 
 
A vida, as suas perdas e os seus ganhos, a sua
mais que perfeita imprecisão, os dias que contam
quando não se espera, o atraso na preocupação
dos teus olhos, e as nuvens que caíram
mais depressa, nessa tarde, o círculo das relações
a abrir-se para dentro e para fora
dos sentidos que nada têm a ver com círculos,
quadrados, retângulos, nas linhas
retas e paralelas que se cruzam com as
linhas da mão;

a vida que traz consigo as emoções e os acasos,
a luz inexorável das profecias que nunca se realizaram
e dos encontros que sempre se soube que
se iriam dar, mesmo que nunca se soubesse com
quem e onde, nem quando; essa vida que leva consigo
o rosto sonhado numa hesitação de madrugada,
sob a luz indecisa que apenas mostra
as paredes nuas, de manchas húmidas
no gesso da memória;

a vida feita dos seus
corpos obscuros e das suas palavras
próximas. 


Nuno Júdice
, in "Teoria Geral do Sentimento"
Quetzal Editores, 1999
 
 
Cristiano Banti, Confidences, 1868.
 

"Não há nada em que paire tanta sedução e maldição como um segredo." 
 
Søren Kierkegaard, "Enten – Eller. Første del", 1843.
 
 
 Cristiano Banti, Woman Sewing on the Terrace, 1882, Palazzo Pitti


"Acima de tudo, não se esqueça da obrigação de amar a si mesmo."

Søren Kierkegaard, Carta a Hans Peter, primo de Kierkegaard, 1848.
 
 

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