Max Römer (Pintor de origem alemã que viveu na ilha da Madeira, 1878-1960),
Sé Catedral do Funchal, 1927.
Fio do frio
Os dias de dezembro
não são sempre os dias de dezembro
e a certeza do olhar
não está no sol em ausência
ou no fio de frio que se estende
entre rosas e pomares
dum lado a outro dum inverno tardio,
às vezes a chuva vem cedo e o fogo do céu
rasga as árvores, às vezes perde-se
o termo das estradas no nevoeiro
e o fim das tardes arrepia-se escuro
nos pés dos vagabundos.
Não está no hábito com que à boca
chega a vontade duma palavra útil
ou apenas dum bocejo, digo azul essa
não é a cor destas horas,
não está aqui nem se torna visível a sombra
ou o passo que imprime a diferença, o som
ou a janela equivalente à luz que falta
a música que acende uma memória doce
às formas que dão ao coração
o ensejo dos astros e distantes amores.
Nada está aqui que me diga dezembro
porque dezembro é um hálito sagrado
e o prodígio aponta o indizível.
Porque dezembro é também coisa tão simples
como os galos, o sótão
o altar da infância aconchegado
de ensaião e acácias
porque em dezembro se trazia
estrelas na algibeira
e um fruto no céu a dispersar o medo.
Irene Lucília Andrade,
Fio de dezembro. Margem 2.
Funchal. N.º 10 (Dez. 1998).
[Irene Lucília Mendes de Andrade (Funchal, 6 de fevereiro de 1938) é uma escritora, poetisa e artista plástica portuguesa, natural da ilha da Madeira. É considerada uma das personalidades mais importantes da literatura contemporânea madeirense.]
"O único meio de criar homens livres é educá-los, outro modo ainda não se inventou,
e com certeza nunca se inventará."
Olavo Bilac, Obra reunida - Página 517,
Alexei Bueno - Editora Nova Aguilar, 1996.
Olavo Bilac, Obra reunida - Página 517,
Alexei Bueno - Editora Nova Aguilar, 1996.

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