quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

"Natal… Natais" - Poema de João Cabral do Nascimento

 


Hans Burgkmair the Elder (German painter and woodcut printmaker, 1473–1531),
 Die Geburt Christi (Nativity of Jesus), 1511.


Natal… Natais…

 
Tu, grande Ser,
Voltas pequeno ao mundo.
Não deixas nunca de nascer!
Com braços, pernas, mãos, olhos, semblante,
Voz de menino.
Humano o corpo e o coração divino.

Natal… Natais…
Tantos vieram e se foram!
Quantos ainda verei mais?

Em cada estrela sempre pomos a esperança
De que ela seja a mensageira,
E a sua chama azul encha de luz a terra inteira.
Em cada vela acesa, em cada casa, pressentimos
Como um anúncio de alvorada;
E em cada árvore da estrada
Um ramo de oliveira;
E em cada gruta o abrigo da criança omnipotente;

E no fragor do vento falas de anjos, e no vácuo
De silêncio da noite
Estriada de súbitos clarões,
A presença de Alguém cuja forma é precária
E a sua essência, eterna.

Natal… Natais…
Tantos vieram e se foram!
Quantos ainda verei mais?


João Cabral do Nascimento
,
in "Cancioneiro", 1943.

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