quinta-feira, 5 de junho de 2025

"O Narciso" - Poema de Miguel Torga


Dirck van Baburen (Dutch painter, c. 1595–1624), 
 "Narcissus Gazing at His Reflection", Private collection.


O Narciso

 
O desenho impreciso
De cada rosto humano, refletido!
Mas, o velho Narciso
Continua fiel e debruçado
Sobre o ribeiro...
Porque há de ver-se inteiro
Quem todo se deseja revelado?

Devorador da vida lhe chamaram,
A ele, artista, sábio e pensador,
Que denodadamente se procura!

À movediça e trágica tortura
De velar dia e noite a líquida corrente
Que dilui a verdade,
Quiseram-lhe juntar a permanente
Ironia
Desse labéu de pérfida maldade
Que turva mais ainda a imagem fugidia...
 
 
Miguel Torga, Cântico do homem, 1950.
Poesia Completa (Dom Quixote, 2000), p. 388.
 

"Narcissus at the Spring" by Jan Roos (Flemish artist, 1591–1638)
depicts Narcissus gazing at his own reflection.


Narciso
 
Narciso era filho de Cefísio, rei da Fócida, e da ninfa Liríope, que era filha do Oceano e de Tétis, sua mulher. Quando já era jovem, era tão formoso, que todas as ninfas o amavam e desejavam, sem que ele se deixasse prender por nenhuma delas. A ninfa Eco, filha do Ar e da Terra, que vivia nas margens do Rio Cefísio, não tendo conseguido seduzi-lo, morreu de amor.
Tirésias, adivinho famoso, preveniu os familiares de Narciso de que este só viveria enquanto não chegasse a contemplar a sua imagem. E um dia, de regresso de uma longa caçada, sentou-se à beira de uma fonte para beber e refrescar-se e viu-se no espelho da água. Ficou tão enamorado de si próprio, que morreu extasiado.
Foi metamorfoseado em flor, à qual foi dado o seu nome. (daqui)
 
 
Jan Cossiers (Flemish painter and draughtsman, 1600–1671),
Narcissus, 17th century, Museo del Prado.
 
 
"O valor do homem é determinado, em primeira linha, pelo grau e pelo sentido 
em que se libertou do seu ego."

Albert Einstein (Nobel de Física, 1921)
 
 
Gerard van Kuijl (Dutch Golden Age painter, 1604–1673),
Narcissus, c. 1645. John and Mable Ringling Museum of Art
 

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