
Claude Monet (French painter and founder of impressionist painting, 1840–1926),
The Luncheon: Camille Doncieux and Jean Monet (Le Déjeuner), 1868,
Städel Museum, Frankfurt.
Oh as casas as casas as casas
Oh as casas as casas as casas
as casas nascem vivem e morrem
Enquanto vivas distinguem-se umas das outras
distinguem-se designadamente pelo cheiro
variam até de sala pra sala
As casas que eu fazia em pequeno
onde estarei eu hoje em pequeno?
Onde estarei aliás eu dos versos daqui a pouco?
Terei eu casa onde reter tudo isto
ou serei sempre somente esta instabilidade?
As casas essas parecem estáveis
mas são tão frágeis as pobres casas
Oh as casas as casas as casas
mudas testemunhas da vida
elas morrem não só ao ser demolidas
Elas morrem com a morte das pessoas
As casas de fora olham-nos pelas janelas
Não sabem nada de casas os construtores
os senhorios os procuradores
Os ricos vivem nos seus palácios
mas a casa dos pobres é todo o mundo
os pobres sim têm o conhecimento das casas
os pobres esses conhecem tudo
Eu amei as casas os recantos das casas
Visitei casas apalpei casas
Só as casas explicam que exista
uma palavra como intimidade
Sem casas não haveria ruas
as ruas onde passamos pelos outros
mas passamos principalmente por nós
Na casa nasci e hei de morrer
na casa sofri convivi amei
na casa atravessei as estações
Respirei – ó vida simples problema de respiração
Oh as casas as casas as casas
Ruy Belo, in "País possível", 1973.
Escrito em 1973, este é um livro que permanece extremamente atual e que possui uma indubitável unidade temática: «a do mal-estar de um homem que ao longo da vida, tem pagado caro o preço por ter nascido em Portugal», tal como afirma o próprio Ruy Belo na sua nota introdutória. Estamos pois perante um volume que aborda Portugal como um país real, não mítico ou mitificado, ou então como um país ainda irreal, mas que depois de tornado real, tende a tornar-se impossível. Nas próprias palavras de Ruy Belo: «Portugal, país que só existe em pensamento».
O prefácio da presente edição é de Nuno Júdice. (daqui)
O prefácio da presente edição é de Nuno Júdice. (daqui)

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