domingo, 25 de junho de 2023

"Os Pobres" - Poema de Olavo Bilac



Manuel Henrique Pinto
(Pintor português, 1853-1912), "As velhas" ou "As velhas do café", 1903
(Figueiró dos Vinhos, Portugal)




Os Pobres


Aí vêm pelos caminhos,
Descalços, e pés no chão,
Os pobres que andam sozinhos,
Implorando compaixão.

Vivem sem cama e sem teto,
Na fome e na solidão:
Pedem um pouco de afeto,
Pedem um pouco de pão.

São tímidos? São covardes?
Têm pejo? Têm confusão?
Parai para os encontrardes,
E dai-lhes a vossa mão!

Guiai-lhes os tristes passos!
Dai-lhes, sem hesitação,
O apoio de vossos braços,
Metade de vosso pão!

Não receeis que, algum dia,
Vos assalte a ingratidão:
O prémio está na alegria
Que tereis no coração.

Protegei os desgraçados,
Órfãos de toda a afeição:
E sereis abençoados
Por um pedaço de pão... 
 
 
Olavo Bilac
, in Antologia poética


Olavo Bilac, Antologia poética, 1997
 Coleção L&PM

 

Resumo 
 
Quem escreveu In extremis, Hino à tarde e outros poemas desse nível é um grande poeta, teve a alma vibrando de beleza. Esta seleção pretende fazer justiça a Olavo Bilac. Para ele eram tão fáceis a expressão e a palavra, escrita ou falada, que a bem dizer teve o direito de se demorar no âmbito delas, sem aprofundar uma visão da vida, a pregar o dever de ser bom, instruído, trabalhador, patriota e amar. Com isso todos estavam de acordo e adotaram o poeta, jornalista e orador que o sabia dizer tão bem. (...) Realmente, ninguém tem na língua verso mais plástico e musical. Nem Bocage, nem Guerra Junqueiro, nem Vicente de Carvalho. E essa música, nos momentos de êxtase que são vários, já é música das esferas, vai ao cerne da vida. - Paulo Hecker Filho (daqui)



Olavo Bilac
 
Nasce em 1865 no Rio de Janeiro. Seu nome completo, Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac, dá um verso alexandrino, o que sempre foi tomado popularmente como um sinal de sua vocação. Obtém matrícula na Faculdade de Medicina aos 15 anos, vai até o quinto ano, passa a Direito, mas não termina nenhum curso superior, tinha mais o que fazer. E fazia: escrevia e vivia sem parar, em rodas boémias, literaturas, amores. Aos 21, um soneto em francês, o que era chique e não incomum na época, sai com o “Ora (direis) ouvir estrelas”. É o sucesso, que logo o tornaria o mais conhecido e benquisto homem de letras do país de todos os tempos, até a morte em 1918 (de edema pulmonar por insuficiência cardíaca, tinha gasto o coração...).

A prosa é inacabável, inclusive com contos e um romance, “O esqueleto”, mas mais artigos, conferências, crónicas, e que reúne em vida em vários volumes, alguns em colaboração, com Coelho Neto, Pardal Mallet, até com o Eça iniciou brincando um romance. Em verso, edita “Poesias” em 1988, com a “Profissão de fé”, em que, num eco de “L´art” de Théophile Gautier, empunha a bandeira da Arte e dá o poeta como ourives; não param de criticar, mas ele até podia, pelo poeta que era além do ou­rives... Seguiam-se, no volume, “Panóplias”, “Via Láctea” e “Sarças de fogo”. A segunda é uma série de 35 sonetos, dados aqui na íntegra, e que, na maioria, cantam um amor, com uma perfeição que impressiona, ainda mais se lembrarmos que tinha apenas 23 anos. Apesar da repercussão, a segunda edição de “Poesias” só vem em 1902, acrescentada de “Alma inquieta”, “As viagens” e “O caçador de esmeraldas”, tentativa de poema épico procurada, verbal, mas que acha inspiração para o fim, aqui reproduzido. De 1904 são as “Poesias infantis”, de que o Brasil aprendeu e ainda hoje sabe de cor tantos versos. Por fim, o livro que o grande sensual quer com a solenidade do crepúsculo, “Tarde”, em 1919, no ano seguinte de sua morte, mas cujas provas ainda revisou.

Texto de Paulo Hecker Filho. Em Antologia Poética (L&PM POCKET, v.38) (daqui)


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