sexta-feira, 5 de abril de 2024

"Passeio" - Poema de Hilda Hilst



Julius LeBlanc Stewart (American artist, 1855-1919), The Goldsmith Ladies in the Bois 
de Boulogne in 1897 on a Peugeot cart. Musée du Château de Compiègne, France.
 


Passeio 

 
De um exílio passado entre a montanha e a ilha
Vendo o não ser da rocha e a extensão da praia.
De um esperar contínuo de navios e quilhas
Revendo a morte e o nascimento de umas vagas.
De assim tocar as coisas minuciosa e lenta
E nem mesmo na dor chegar a compreendê-las.
De saber o cavalo na montanha. E reclusa 
Traduzir a dimensão aérea do seu flanco.
De amar como quem morre o que se fez poeta
E entender tão pouco seu corpo sob a pedra.
E de ter visto um dia uma criança velha
Cantando uma canção, desesperando,
É que não sei de mim. Corpo de terra. 


Hilda Hilst
, in "Exercícios"



Hilda Hilst, "Exercícios" 


Resumo 
 
Com a publicação de Exercícios, a Editora Globo dá continuidade ao seu projeto de relançamento da obra de Hilda Hilst. Este volume apresenta oito anos (de 1959 a 1967) da produção poética da autora. Alguns desses títulos tiveram uma publicação independente e outros apareceram pela primeira vez na antologia publicada em 1967 pela extinta editora Sal. Vale registar que todos os títulos são muito raros e dificilmente encontráveis no comércio de livros usados. A nova edição pretende facilitar aos leitores e admiradores o acesso a esses poemas. A reunião serve também para mostrar um momento importante da produção da poetisa: quando ela ainda não tentara a prosa e procurava uma poesia encharcada de lirismo. Em alguns títulos, como é o caso de "Trovas de muito amor para um amado senhor", Hilda Hilst constrói poemas inspirados nos famosos cantares medievais. Além da temática amorosa, marcante em praticamente todos os seus livros, a autora procura obter efeitos de musicalidade característicos das cantigas medievais. Em outra parte dos poemas de Exercícios, pode-se notar (o que também é muito comum na produção hilstiana) uma forte presença de questões místicas e religiosas. São exemplos disso os poemas de "Sete cantos do poeta para o anjo" e de "Pequenos funerais cantantes ao poeta Carlos Maria de Araújo". Nesse caso, a poetisa mostra-se perplexa perante a presença do misterioso e articula sua poética em torno das possibilidades do ser diante das questões divinas. Em um e outro caso, contudo, o que sobressai é a imensa carga lírica com que Hilda Hilst trabalha a poesia dessa fase de sua obra. (daqui)
 

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