quarta-feira, 17 de abril de 2024

"Tempo fluvial" - Poema de Nuno Júdice


Winslow Homer (American painter, photographer, printmaker and illustrator, 1836 - 1910), 
Girl reading on a stone porch, 1872.
 

Tempo fluvial


Se eu definisse o tempo como um rio,
a comparação levar-me-ia a tirar-te
de dentro da sua água, e a inventar-te
uma casa. Poria uma escada encostada
à parede, e sentar-te-ias num dos seus
degraus, lendo o livro da vida. Dir-te-ia:
«Não te apresses: também a água deste
rio é vagarosa, como o tempo que os
teus dedos suspendem, antes de virar
cada página.» Passam as nuvens no céu;
nascem e morrem as flores do campo;
partem e regressam as aves; e tu lês
o livro, como se o tempo tivesse parado,
e o rio não corresse pelos teus olhos.


Nuno Júdice
(1949-2024)

 
 
 
"Olhasses tu o mundo da perspetiva da rã ou da relva e serias tão humilde e discreto como elas. "

Casimiro de Brito, in "A arte da respiração"
 

Winslow Homer, The New Novel, 1877 (Watercolor on paper)
 

Quando livros já não tiver
lerei as estrelas -
  quando elas se cansarem
da minha solidão
lerei a palma
da mão.


Casimiro de Brito, in "Arte Pobre".
Leiria: Editorial Diferença, s.d., p. 55.


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