sábado, 27 de junho de 2020

"Catarina Eufémia" - Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen


Cyprien Eugène Boulet (1877–1927), Mulher do Xaile Verde, s/d 



Catarina Eufémia


O primeiro tema da reflexão grega é a justiça
E eu penso nesse instante em que ficaste exposta
Estavas grávida porém não recuaste
Porque a tua lição é esta: fazer frente

Pois não deste homem por ti
E não ficaste em casa a cozinhar intrigas
Segundo o antiquíssimo método oblíquo das mulheres
Nem usaste de manobra ou de calúnia
E não serviste apenas para chorar os mortos

Tinha chegado o tempo
Em que era preciso que alguém não recuasse
E a terra bebeu um sangue duas vezes puro

Porque eras a mulher e não somente a fêmea
Eras a inocência frontal que não recua
Antígona poisou a sua mão sobre o teu ombro
 no instante em que morreste
E a busca da justiça continua


Sophia de Mello Breyner Andresen, Dual, 1972
Poema sobre a ceifeira Catarina Eufémia (1928-1954) 


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