segunda-feira, 29 de junho de 2020

"As cem linguagens da criança" - Poema de Loris Malaguzzi


Jean-Paul Louis Martin des Amoignes (1858–1925), Dans la salle de classe, 1886



As cem linguagens da criança


A criança é feita de cem.
A criança tem cem mãos
cem pensamentos
cem modos de pensar
de jogar e de falar.
Cem, sempre cem
modos de escutar
de maravilhar e de amar.
Cem alegrias
para cantar e compreender.
Cem mundos
para descobrir.
Cem mundos
para inventar.
Cem mundos
para sonhar.
A criança tem
cem linguagens
(e depois cem, cem, cem)
mas roubaram-lhe noventa e nove.
A escola e a cultura
lhe separam a cabeça do corpo.
Dizem-lhe:
de pensar sem as mãos
de fazer sem a cabeça
de escutar e de não falar
de compreender sem alegrias
de amar e de maravilhar-se
só na Páscoa e no Natal.
Dizem-lhe:
de descobrir um mundo que já existe
e de cem roubaram-lhe noventa e nove.
Dizem-lhe:
que o jogo e o trabalho
a realidade e a fantasia
a ciência e a imaginação
o céu e a terra
a razão e o sonho
são coisas
que não estão juntas.
Dizem-lhe enfim:
que as cem não existem.
A criança diz:
Ao contrário, as cem existem.


Loris Malaguzzi
(1920-1994)
As Cem Linguagens da Criança

Loris Malaguzzi, professor italiano que criou a abordagem educativa mais conhecida como Reggio Emilia e defensor da pedagogia da escuta, ele a relacionava ao debate acerca da linguagem oral e escrita, mas também ao estudo do cérebro e às ideias sobre os processos de aprendizagem (“aprender fazendo” de John Dewey). Reggio Emilia é uma pequena província considerada colaborativa, cuja Educação Infantil foi considerada a melhor do mundo em 2013, e difunde largamente a ideia das Cem Linguagens. Para o educador, não só o que a criança pensa é válido, mas válidas são também as múltiplas linguagens da infância e a forma como as crianças pesquisam, produzem sentido e conhecimento.

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