Ilustração de Edward Julius Detmold (1883-1957)
Primavera
A primavera é a estação dos risos,
Deus fita o mundo com celeste afago,
Tremem as folhas e palpita o lago
Da brisa louca aos amorosos frisos.
Na primavera tudo é viço e gala,
Trinam as aves a canção de amores,
E doce e bela no tapiz das flores
Melhor perfume a violeta exala.
Na primavera tudo é riso e festa,
Brotam aromas do vergel florido,
E o ramo verde de manhã colhido
Enfeita a fronte da aldeã modesta.
A natureza se desperta rindo,
Um hino imenso a criação modula,
Canta a calhandra, a juriti arrula,
O mar é calmo porque o céu é lindo.
Alegre e verde se balança o galho,
Suspira a fonte na linguagem meiga,
Murmura a brisa: - Como é linda a veiga!
Responde a rosa: - Como é doce o orvalho!
Ilustração Edward Julius Detmold
"Se não tivéssemos inverno, a primavera não seria tão agradável: se não experimentássemos algumas vezes o sabor da adversidade, a prosperidade não seria tão bem-vinda." - Anne Bradstreet
Poetisa norte-americana [cuja nacionalidade se convencionou ser norte-americana], Anne Bradstreet nasceu no ano de 1612 em Northampton, na Inglaterra. O pai, funcionário do Conde de Lincoln, havia participado no movimento da Reforma, acabando por se tornar impopular pelas suas convicções religiosas.
A família foi posta aos cuidados do filho de um sacerdote puritano, Simon Bradstreet, assistente na recém-criada companhia de navegação Massachusetts Bay Company, e com quem Anne casou, quando contava apenas dezasseis anos de idade. Em 1630 emigrou com a família para a América a bordo do Arbella, embarcação lendária por ter sido uma das primeiras a prestar serviço no êxodo puritano.
Chegados à Nova Inglaterra após três meses de tribulações, procuraram instalar-se: o pai de Anne conseguiu ser nomeado Vice-Governador de Boston e o marido Administrador-Principal da mesma cidade.
Não obstante, Anne não teve a mesma sorte: à dureza da viagem acresceram as dificuldades de adaptação ao clima e ao processo de estabelecimento. Assim, após ter contraído papeira, foi vítima de uma paralísia progressiva que lhe afetou as articulações, o que não a impediu de dar à luz oito crianças.
Restringida ao domínio das tarefas domésticas, Anne procurou sublimar as longas e continuadas ausências do marido, sempre tratando dos assuntos de estado e da fixação dos pioneiros, lendo e escrevendo versos.
Em 1649, um dos seus irmãos levou consigo um manuscrito contendo os seus poemas, que publicou com o título The Tenth Muse (1649). O livro seria reeditado no ano seguinte como The Tenth Muse Lately Sprung Up In America (1650), desta feita em Boston. Escrevendo sobre a vida quotidiana dos colonos britânicos na América, a obra de Bradstreet, embora demonstrando uma certa vivacidade, foi esquecida, pela abundância de lugares-comuns e estética puritana, por constituir um exercício de estilo imitativo da poesia da época. Foi no entanto redescoberta pelas feministas do século XX, que afirmaram encontrar nos poemas de Bradstreet qualidades artísticas significativas.
A sua saúde periclitante foi seriamente abalada quando contraiu tuberculose, que veio eventualmente a causar-lhe a morte, ocorrida a 16 de setembro de 1672, em Andover, Massachusetts. (Daqui)
Edward Julius Detmold, "Three large butterflies on irises and lilies"
"O inverno cobre minha cabeça, mas uma eterna primavera vive em meu coração."
John Mayer - Half of my heart
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