Mahler
(A Canção de Deus e Morte)
No jardim das almas
A fala caída.
Como se fosse a canção de
Deus e Morte.
A canção do cadáver
Sombrosa e rente.
Uivo. Brechas.
Ululante.
Compassadamente
O coração solto
Rasgado contra o céu maciço.
E de abismo ou de crateras
Um ardil. Incessante
Profundidade e permanência interminável
Na terra ímpia.
O relâmpago rasteja Deus.
Abre-se a solidão
Nos ombros do Inferno.
Quem vislumbra pérfido
No alçapão da sombra?
E o ricochete da luz?
Que castigo inexpiável?
Haverá uma música da fatalidade?
E quem lhe deve obedecer?
Sou miserável e perturbante.
Dou-me à paisagem destituída.
À árvore devastadora. À borboleta esmagada.
(O restolho enovelando.
Um bestiário precipitando-se.
Sacudindo-me.
Que aurora imprevista
Impulsivamente no mundo?)
Cantava a impaciência
Melancólica.
A dor radiante.
A vastidão.
José Emílio-Nelson,
in A Palidez do Pensamento
José Emílio-Nelson nasceu em 1948 em Espinho. Obras: Polifonia (1979), Polifemo e Outros Poemas (1983), Extrema Paixão (1984), Nu Inclinado (1985), Queda do Homem (1989), Vida Quotidiana e Arte Menor (1990), A Palidez do Pensamento (1990), Claro Escuro ou a Nefasta Aurora (1992), Sodoma Sacrílega e Poesia Vária (1991), Mosaico (1996), A Alegria do Mal - Obra Poética 1979-2004 (Quasi, 2004).
Nota crítica sobre a poesia de José Emílio-Nelson, por Luís Adriano Carlos
José Emílio-Nelson, editor dos seus próprios livros, é um daqueles poetas que a crítica insiste em não reconhecer como uma das vozes mais originais da poesia portuguesa das últimas duas décadas.
Nota crítica sobre a poesia de José Emílio-Nelson, por Luís Adriano Carlos
José Emílio-Nelson, editor dos seus próprios livros, é um daqueles poetas que a crítica insiste em não reconhecer como uma das vozes mais originais da poesia portuguesa das últimas duas décadas.
Situando as suas referências numa genealogia heteróclita e maldita que
passa principalmente por Sade, Lautréamont, Rimbaud, Nietzsche, Jarry,
Ângelo de Lima, Artaud e Bataille, associa com ostensivo sentido
derrisório uma altivez aristocrática da expressão a um hieratismo
litúrgico em que o simbolismo sacral da linguagem é atravessado por
intensos odores de profanação escatológica. Poesia que cinicamente
recusa a ética da virtude e dos bons sentimentos, encontra na reinvenção
de uma inconfundível estética do vício e da crueldade o melhor caminho
para separar a estética da moral e exercer sem contemplações uma crítica
ética da natureza infra-humana ou demasiado humana que a Moderna poesia
virtuosa e benquista acaba por camuflar sob o manto da beleza, do bom
gosto, da razão ou mesmo do prestígio cultural. Dionisíaca e satânica,
dissolvendo as imagens da tentação em cenários que evocam o mundo-cão
boschiano e enfatizando a violência transgressora do erotismo, liberta
das palavras as suas pulsões mais negras com vista a uma teatralização
da escrita plena de descrições que perfuram perversamente os objectos
nomeados. Tudo isto implica uma desarmante consciência da escrita como
gozo sensual e libidinoso, apesar de contida e despojada, ou como
voluptuosa deglutição de fragmentos citacionais, oriundos de toda uma
rede de textos literários e artísticos, que actuam reativamente no
metabolismo do discurso para proporem um pacto de leitura assente no
mais excessivo dos desconfortos críticos. (Daqui)
Gustav Mahler - Symphony No. 3 (Lucerne Festival Orcherstra, Claudio Abbado)
Gustav Mahler, compositor e maestro austríaco nasceu em 1860, na Boémia, na
Áustria, e morreu em 1911, em Viena. Foi um dos compositores mais
marcantes da música do século XX, acabando por exercer uma enorme
influência em Arnold Schoenberg, Dimitri Shostakovich e Benjamin
Britten.
O seu talento musical revelou-se muito cedo. Com apenas
quatro anos, fascinado pela música militar e pela música popular,
começou a compor pequenas peças de piano e, aos quinze anos, ingressou
no Conservatório de Viena. Os anos seguintes foram marcados pela sua
ascensão como maestro e, aos trinta e sete anos, foi nomeado diretor da
Ópera de Viena.
Influenciada pela escola de Richard Wagner e de Franz
Liszt, a expressão musical de Mahler não era mais do que uma visão
pessoal do mundo. A própria tensão, o estilo retórico, as orquestrações
vivas e o uso irónico da música popular encontram-se bem presentes em
várias sinfonias -- de fortes contrastes, mas unidas pela sua
personalidade inequívoca.
O programa da orquestração da Symphony N.º 1 in D Major (1888) é uma autobiografia da sua juventude; o prazer da vida foi perturbado pela obsessão da morte na macabra Funeral March in the Manner of Callot. Os cinco andamentos da Symphony N.º 2 (1894) abrem, também, com a obsessão da morte. A Symphony N.º 3 in D Major
(1896) representa, em seis andamentos, a visão dionisíaca de uma enorme
sequência de pessoas, que se movem da natureza inanimada para a
consciência de Deus.
Os elementos religiosos, presentes nos seus
trabalhos, são extremamente significativos, uma vez que a sua infância e
juventude foram marcadas pelas tensões raciais (ele era judeu) e pelos
conflitos entre os seus pais.
Depois de dirigir espetáculos no Metropolitan Opera e de ser maestro da Philharmonic Society of New York,
regressou definitivamente a Viena, onde morreu em 1911. Embora a sua
música fosse ignorada durante os cinquenta anos que se seguiram à sua
morte, Mahler passou a ser olhado como um dos precursores das técnicas
de composição do século XX, sendo celebrizado pelas dez sinfonias que compôs. (Daqui)
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