Poema destinado a haver domingo
Bastam-me as cinco pontas de uma estrela
E a cor dum navio em movimento.
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.
Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio do cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.
Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.
Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o teto da casa que me cobre
Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.
E a cor dum navio em movimento.
E como ave, ficar parada a vê-la
E como flor, qualquer odor no vento.
Basta-me a lua ter aqui deixado
Um luminoso fio do cabelo
Para levar o céu todo enrolado
Na discreta ambição do meu novelo.
Só há espigas a crescer comigo
Numa seara para passear a pé
Esta distância achada pelo trigo
Que me dá só o pão daquilo que é.
Deixem ao dia a cama de um domingo
Para deitar um lírio que lhe sobre.
E a tarde cor-de-rosa de um flamingo
Seja o teto da casa que me cobre
Baste o que o tempo traz na sua anilha
Como uma rosa traz Abril no seio.
E que o mar dê o fruto duma ilha
Onde o Amor por fim tenha recreio.
Natália Correia, in "Passaporte".
Lisboa, Editora Gráfica Portuguesa, 1958
Os Animais e o Homem
"Desde Montaigne e ainda hoje, entretemo-nos de bom grado com um desígnio que nada tem de caridoso, a meu ver, em comparar os animais com o homem. Querem reduzir a quase nenhuma a distância que separa as suas faculdades; de facto, elas tocam-se, exceto num ponto, que está bem próximo de ser tudo: é que um faz por princípios o que os outros fazem por necessidade e natureza, ou seja, um pensa e os outros parecem pensar."
Jules Lagneau, in 'Discurso de Senso Comum'
Jules Lagneau (França, 1851-1894),
Filósofo
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