Octavia Walton Le Vert, painted in 1833 by Thomas Sully.
Ironias do Desgosto
Onde é que te nasceu - dizia-me ela às vezes -
O horror calado e triste às coisas sepulcrais?
Por que é que não possuis a verve dos franceses
E aspiras, em silêncio, os frascos dos meus sais?
Por que é que tens no olhar, moroso e persistente,
As sombras dum jazigo e as fundas abstrações,
E abrigas tanto fel no peito, que não sente
O abalo feminil das minhas expansões?
Há quem te julgue um velho. O teu sorriso é falso;
Mas quando tentas rir parece então, meu bem,
Que estão edificando um negro cadafalso
E ou vai alguém morrer ou vão matar alguém!
Eu vim - não sabes tu? - para gozar em maio,
No campo, a quietação banhada de prazer!
Não vês, ó descorado, as vestes com que saio,
E os júbilos, que abril acaba de trazer?
Não vês como a campina é toda embalsamada
E como nos alegra em cada nova flor?
Então por que é que tens na fronte consternada
Um não-sei-quê tocante e enternecedor?
Eu só lhe respondia: — Escuta-me. Conforme
Tu vibras os cristais da boca musical,
Vai-nos minando o tempo, o tempo - o cancro enorme
Que te há de corromper o corpo de vestal.
E eu calmamente sei, na dor que me amortalha,
Que a tua cabecinha ornada à Rabagas,
A pouco e pouco há de ir tornando-se grisalha
E em breve ao quente sol e ao gás alvejará!
E eu que daria um rei por cada teu suspiro,
Eu que amo a mocidade e as modas fúteis, vãs,
Eu morro de pesar, talvez, porque prefiro
O teu cabelo escuro às veneráveis cãs!
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