domingo, 25 de setembro de 2016

"Não voltarás" - Poema de José Manuel Mendes


Mota Urgeiro (Pintor português, n. 1946), Pôr do sol no rio 
 


Não voltarás


não voltarás 
olhando as ruas 
na vidraça nua os zimbros 
da terra ocre 

moras secreta nestes barros 
tua flauta canta nas montanhas 
pedras e trepadeiras se enroscam 
perto do teu rosto 
e são de 
água 

sabes plantar o odor 
dos frutos 
tangerina limão 
pássaras orvalho 
a nervura das manhãs 
e o lume dos poemas 
quente metalurgia 
das palavras 

como ontem (tu eras morta) 
prolonga-te nestas mãos 
no maio das rotas 
de abril 
tecidas 


 in 'Rosto Descontínuo'


Mota Urgeiro, Outono na Cova da Beira


"Duas folhas na sandália
o outono
também quer andar"

(Haikai)


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