Meus amigos, meus conhecidos
Meus amigos, meus conhecidos, meus afetos e desafetos,
meus leitores e detratores, ouçam e atendam:
quando chegar a hora do meu último repouso,
busquem meu corpo onde ele estiver,
na poeira do Rio ou na neve gaúcha,
nalgum Japão antípoda, ou aqui mesmo,
na rua Dr. Luiz Januário, uma rua que
possivelmente já tenha perdido os belos paralelepípedos
em nome do duvidoso progresso.
Busquem meu corpo de carro ou rabecão, de carrinho de mão
ou num simples lençol usado,
e depositem ali, atrás da Igreja da mãe de Nazaré,
naquela terra que o mato insiste em invadir,
e onde não há sinal de diferença de classe ou de sonho,
tão singelas são as lápides.
Deitem-me ali, com toda memória possível que tenham de mim,
lembrem e inventem sobre a minha vida, mas deixem-me ali.
Quero enfrentar a vida eterna com prazer,
o vento e o azul do céu fazendo um toldo móvel sobre o meu leito.
Eu e o silêncio
ouvindo eternamente o mar.
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