sábado, 6 de agosto de 2011

"Tão grande dor" - Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen






Tão grande dor 


Timor fragilíssimo e distante
Do povo e da guerrilha 
Evanescente nas brumas da montanha 

«Sândalo flor búfalo montanha
Cantos danças ritos 
E a pureza dos gestos ancestrais»

Em frente ao pasmo atento das crianças 
Assim contava o poeta Ruy Cinatti 
Sentado no chão 
Naquela noite em que voltara da viagem 

Timor 
Dever que não foi cumprido e que por isso dói 

Depois vieram notícias desgarradas 
Raras e confusas 
Violências mortes crueldade 
E anos após ano 
Ia crescendo sempre a atrocidade 
E dia a dia - espanto prodígio assombro -
Cresceu a valentia 
Do povo e da guerrilha 
Evanescente nas brumas da montanha 

Timor cercado por um bruto silêncio 
Mais pesado e mais espesso do que o muro 
De Berlim que foi sempre falado 
Porque não era um muro mas um cerco 
Que por segundo cerco era cercado 

O cerco da surdez dos consumistas 
Tão cheios de jornais e de notícias 

Mas como se fosse o milagre pedido 
Pelo rio da prece ao som das balas 
As imagens do massacre foram salvas 
As imagens romperam os cercos do silêncio 
Irromperam nos écrans e os surdos viram 
A evidência nua das imagens 




Aldeia nas montanhas de Aileu, Timor-Leste.


“A saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora.”



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