domingo, 8 de janeiro de 2012

"Criança Desconhecida" - Poema de Alberto Caeiro


Pintura de Donald Zolan


Criança Desconhecida 


Criança desconhecida e suja brincando à minha porta, 
Não te pergunto se me trazes um recado dos símbolos. 
Acho-te graça por nunca te ter visto antes, 
E naturalmente se pudesses estar limpa eras outra criança, 
Nem aqui vinhas. 
Brinca na poeira, brinca! 
Aprecio a tua presença só com os olhos. 
Vale mais a pena ver uma coisa sempre pela primeira vez que conhecê-la, 
Porque conhecer é como nunca ter visto pela primeira vez, 
E nunca ter visto pela primeira vez é só ter ouvido contar. 

O modo como esta criança está suja é diferente do modo como as outras estão sujas. 
Brinca! pegando numa pedra que te cabe na mão, 
Sabes que te cabe na mão. 
Qual é a filosofia que chega a uma certeza maior? 
Nenhuma, e nenhuma pode vir brincar nunca à minha porta. 


Alberto Caeiro, in “Poemas Inconjuntos”, 
Heterónimo de Fernando Pessoa


Kenny G - Sentimental
 

  • "Não me interessa nenhuma religião cujos princípios não melhoram nem tomam em consideração as condições dos animais." - Abraham Lincoln

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