sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

"Alguém" - Poema de Gonçalves Crespo


 
Walter Langley (English painter and founder of the Newlyn School of plein air artists,
1852 – 1922), Meditation, ca. 1904.

 

Alguém 


Para alguém sou lírio entre os abrolhos,
E tenho as formas ideais do Cristo;
Para alguém sou vida e a luz dos olhos,
E se a Terra existe, é porque existo.

Esse alguém que prefere ao namorado
Cantar das aves minha rude voz,
Não és tu, anjo meu idolatrado!
Nem, meus amigos, é nenhum de vós!

Quando alta noite me reclino e deito,
Melancólico, triste e fatigado,
Esse alguém abre as asas no meu leito,
E o meu sono desliza perfumado.

Chovam bênçãos de Deus sobre a que chora
Por mim além dos mares! esse alguém
É de meus dias a esplendente aurora:
És tu, doce velhinha, ó minha mãe!


Gonçalves Crespo, in "Miniaturas", 1870.



Gonçalves Crespo, "Miniaturas" (7ª ed.)
Editora Domingos Barreira

 Sinopse

"Miniaturas", volume de poesias de Gonçalves Crespo, em que a temática amorosa e o retrato da figura feminina (vejam-se composições como "Modesta", "Sara", "Alguém" e "Mãe"), com ressonâncias do lirismo ultrarromântico, não escondem uma evolução no sentido do parnasianismo, com notações sóbrias e realistas de ambientes e cenários vazadas num estilo cuidado e depurado.
Composições como "A sesta", "Na roça" ou "Ao meio-dia" evocam os ambientes tropicais brasileiros, bem familiares ao autor. (daqui)

 

Sem comentários: