terça-feira, 14 de janeiro de 2025

"Não nasci por acaso nestas pedras" - Poema de José Gomes Ferreira


Mota Urgeiro (Pintor português, n. 1946), Porto, Avenida dos Aliados, s.d.


  Poema


(O Eugénio de Andrade espera-me num Café.
Atravesso as ruas do Porto – a cidade onde nasci – 
com os punhos cerrados de dor.) 


Não nasci por acaso nestas pedras
mas para aprender dureza,
lume excedido,
coragem de mãos lúcidas.

Aqui no avesso da construção dos tempos
a palavra liberdade
é menos secreta.

Anda nos olhos da rua
pega lanças aos gestos,
tira punhais das lágrimas,
conclui as manhãs.

E principalmente
não cheira a museu azedo
ou musgo embalado
pela chuva da boca dos mortos.

Começa nos cabelos das crianças
para me sentir mais nascido nestas pedras.

Porto
– cidade de luz de granito.

Tristeza de luz viril
com punhos de grito.


José Gomes Ferreira
,
"Daqui houve nome Portugal" - Antologia de verso e prosa sobre o Porto,
organizada e prefaciada por
Eugénio de Andrade,
Editorial Inova, 1968.
 


Mota Urgeiro, Mercado da Ribeira, Porto, s.d..
 
 
"O Porto ergue-se em anfiteatro sobre o esteiro do Douro e reclina-se no seu leito de granito. Guardador de três províncias e tendo nas mãos as chaves dos haveres delas, o seu aspeto é severo e altivo, como o de mordomo de casa abastada."
 
Alexandre Herculano (Escritor, historiador, jornalista e poeta português, 1810–1877)
 

Sem comentários: