segunda-feira, 15 de março de 2021

"Ria, Rosa, Ria" e "Mascarada" - Poemas de Manuel Bandeira

 
 
 

Ria, Rosa, Ria

                        (A Guimarães Rosa)

Acaba a Alegria
Dizendo-nos: – Ria!
Velha companheira,
Boa conselheira!

Por isso me rio
De mim para mim.
Rio, rio, rio!
E digo-lhes: – Ria,
Rosa, noite e dia!
No calor, no frio,
Ria, ria! Ria,
Como lhe aconselha
Essa doce velha
Cheirando a alecrim,
A alegre Alegria! 
 
 
Guillaume Seignac, Pierrot's Embrace, c. 1900 – óleo sobre tela
 

Mascarada
 
           Você me conhece?
                                              (Frase dos mascarados de antigamente)

– Você me conhece?
– Não conheço não.
– Ah, como fui bela!
Tive grandes olhos,
que a paixão dos homens
(estranha paixão!)
Fazia maiores…
Fazia infinitos.
Diz: não me conheces?
– Não conheço não.

– Se eu falava, um mundo
Irreal se abria
à tua visão!
Tu não me escutavas:
Perdido ficavas
Na noite sem fundo
Do que eu te dizia…
Era a minha fala
Canto e persuasão…
Pois não me conheces?
– Não conheço não.
– Choraste em meus braços
– Não me lembro não.

– Por mim quantas vezes
O sono perdeste
E ciúmes atrozes
Te despedaçaram!

Por mim quantas vezes
Quase tu mataste,
Quase te mataste,
Quase te mataram!
Agora me fitas
E não me conheces?

– Não conheço não.
Conheço que a vida
É sonho, ilusão.
Conheço que a vida,
A vida é traição. 
 
 

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